Rússia Arrisca para Manter Bases Militares na Síria Pós-Assad: Estratégias e Consequências

Um soldado russo está em cima de uma torre d'água na base aérea de Hmeimim, na costa de Latakia, Síria, 15 de dezembro de 2024. REUTERS/Umit Bektas/Foto de Arquivo
Soldado russo observa a área de cima da torre d'água na base aérea de Hmeimim, localizada na região costeira da Síria, em Latakia.REUTERS/Umit Bektas/Foto de Arquivo

Após o fim do regime de Bashar al-Assad, a presença militar russa na Síria passou por uma reconfiguração drástica. Durante anos, as bases russas, como a Hmeimim Air Base e a Tartous Naval Base, operaram com relativa liberdade. No entanto, com a queda de Assad e a mudança do cenário político sírio, a Rússia precisa apostar em estratégias arriscadas para manter sua influência na região. Este artigo analisa as táticas adotadas por Moscou para preservar suas bases, as negociações em curso com as autoridades sírias e as consequências dessa “aposta” geopolítica.

Histórico da Presença Russa na Síria

Historicamente, a Rússia estabeleceu sua presença militar na Síria como um pilar de sua política externa, apoiando o regime de Assad e garantindo acesso estratégico ao Mediterrâneo. Durante o conflito, soldados da Hmeimim Air Base circulavam livremente por cidades costeiras, e aviões de guerra eram frequentemente empregados para bombardear insurgentes islâmicos que enfrentavam o governo de Assad. Essa postura permitia à Rússia projetar poder na região, mas também gerava controvérsias internacionais.

Mudanças no Cenário Pós-Assad

Com a queda de Assad em dezembro de 2024 – que culminou com sua fuga para a Rússia via Hmeimim – a dinâmica mudou. Agora, pequenos grupos de ex-insurgentes, pertencentes à força Hayat Tahrir al-Sham (HTS), assumiram o controle das entradas das bases russas, tanto em Hmeimim quanto na antiga base naval de Tartous, localizada a 60 km ao sul. Esses guardas, uniformizados em khaki, acompanham qualquer comboio russo que se aproxima, impondo um novo nível de vigilância e complicando as operações militares.

Negociações com as Autoridades Sírias

O futuro das bases militares russas na Síria está diretamente nas mãos do presidente interino Ahmed Sharaa. O governo sírio busca renegociar os termos dos contratos assinados durante o regime de Assad – um contrato de 49 anos para a base de Tartous e um contrato indefinido para Hmeimim. Sharaa quer condições mais vantajosas, que incluam apoio diplomático e compensação financeira, mas sem excluir completamente Moscou. Assim, a manutenção das bases pode se concretizar em troca de benefícios econômicos e políticos para o governo sírio.

Fontes diplomáticas e russas relataram que, durante uma reunião de alto nível entre Sharaa e um representante de Vladimir Putin, foram discutidas questões envolvendo bilhões de dólares em dívidas, a possível reintegração de Assad (embora de forma vaga) e a repatriação de fundos sírios que, segundo alguns, teriam sido depositados em Moscou. Embora detalhes específicos não tenham sido divulgados, essas conversas demonstram a complexidade e a sensibilidade do tema.

As Consequências de “Arriscar” para Manter as Bases

Manter as bases russas na Síria é uma aposta com implicações estratégicas e econômicas profundas:

  • Geopolítica e Influência Regional: As bases são fundamentais para a projeção de poder russo no Oriente Médio e na África. Ao arriscar manter esses postos, Moscou assegura seu papel de player decisivo na região, preservando uma alavanca de influência mesmo após a queda de Assad. Contudo, essa decisão também pode gerar tensões com outros atores regionais, como a Turquia e até mesmo com países ocidentais que criticam a intervenção militar russa.
  • Negociações Econômicas e Dívidas: As exigências do governo sírio, que buscam uma compensação pelos estragos da guerra e a revisão dos contratos, podem significar um grande desembolso financeiro para a Rússia. Se Moscou ceder a essas condições, poderá ter que arcar com custos elevados ou comprometer parte de sua influência econômica, o que pode impactar suas prioridades em outras frentes.
  • Riscos Operacionais e de Segurança: Com as bases agora sob a vigilância de grupos islâmicos reorganizados, as operações russas enfrentam riscos operacionais aumentados. A segurança das rotas de suprimento e a integridade das instalações podem ser comprometidas, forçando Moscou a adotar medidas mais rígidas e custosas para proteger seus interesses na região.
  • Legado e Imagem Internacional: A estratégia de “arriscar” para manter as bases também reflete a postura intransigente de Moscou em relação à sua influência histórica. No entanto, essa decisão pode ser interpretada internacionalmente como uma tentativa de manter o controle sobre uma região instável, o que pode afetar negativamente a imagem da Rússia em fóruns multilaterais e em negociações futuras.

Conclusão

A decisão da Rússia de apostar na manutenção de suas bases militares na Síria, mesmo com o cenário político em mutação, é um exemplo claro de como a geopolítica contemporânea exige riscos calculados. Ao negociar com as autoridades sírias, Moscou busca não apenas preservar sua presença militar, mas também garantir uma influência estratégica crucial no Oriente Médio. Entretanto, essa aposta traz consigo uma série de consequências – desde desafios operacionais e econômicos até impactos na imagem internacional – que podem moldar o futuro das relações entre Rússia e Síria e redefinir o equilíbrio de poder na região.

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