Militares do Sudão do Sul Recuperam Nasir em Meio à Escalada de Conflitos Étnicos: Impactos Regionais e Perspectivas

Porta-voz do exército do Sudão do Sul, Major General Lul Ruai Koang, em coletiva de imprensa após tiroteio em Juba, 22 de novembro de 2024.
Major General Lul Ruai Koang, porta-voz do exército do Sudão do Sul, em coletiva de imprensa após uma noite de tiroteios, ocorrida após a tentativa de prisão do ex-chefe do serviço de inteligência, em Juba, 22 de novembro de 2024.REUTERS/Samir Bol/File Photo


Em 20 de abril de 2025, o Exército do Sudão do Sul (SSPDF) anunciou a recaptura de Nasir, cidade estratégica do estado do Alto Nilo, ocupada pela milícia White Army desde 4 de março. Este artigo detalha o contexto político, as reações internacionais, os impactos humanitários e econômicos, além de reunir análises de especialistas e relatos de civis para oferecer um panorama completo e robusto dos desdobramentos.

Contexto Histórico e Crise de Março de 2025

Após o acordo de paz de agosto de 2018, que encerrou a guerra civil de 2013–2018 e estabeleceu um governo de partilha entre o presidente Salva Kiir (Dinka) e o vice‑presidente Riek Machar (Nuer), tensões étnicas persistiram. Em 4 de março de 2025, o White Army — grupo de jovens Nuer acusado de ligação a Machar — tomou a guarnição de Nasir, levando à prisão domiciliar de políticos do SPLM‑IO e elevando temores de um novo conflito étnico em grande escala.

A Operação de Retomada de Nasir

Segundo o porta‑voz do SSPDF, Lul Ruai Koang, o avanço foi realizado sem combates diretos em Nasir. O apoio aéreo próximo permitiu detectar e dispersar uma possível emboscada em Thuluc, antes de a milícia se reagrupar, evitando confronto frontal porém resultando em 17 mortes de civis durante bombardeios nesta aldeia vizinha.

Citações de Especialistas

  • Daniel Akech, analista sênior do International Crisis Group, alerta que “as tensões étnicas não resolvidas e a fragilidade do acordo de paz aumentam significativamente o risco de um novo conflito em grande escala no Alto Nilo”.
  • Nyagoah Tut Pur, pesquisador da Human Rights Watch, destaca: “O uso de armas incendiárias em áreas povoadas tem causado mortes horríveis e ferimentos graves, especialmente em crianças, configurando potencial crime de guerra”.

Vozes de Nasir e das Vítimas

Relatos de ONGs e civis fornecem um aspecto humano essencial:

  • Moradores de Thuluc contam que, durante o bombardeio, “as chamas consumiram casas e campos, deixando famílias sem abrigo em plena noite”.
  • Pal Mai Deng, porta‑voz do SPLM‑IO, afirmou que o partido exige “investigação internacional sobre relatos de uso de armas químicas e incendiárias pelo governo” na região.
    Estimativas da ONU indicam mais de 50.000 deslocados desde o início das hostilidades, com falta de água, alimentos e atendimentos médicos básicos nas áreas afetadas.

Ações Regionais e Diplomacia

  • IGAD: O secretário executivo Dr. Workneh Gebeyehu exigiu “máxima contenção e reconfirmação de compromisso com o Acordo R-ARCSS, priorizando o diálogo”.
  • União Africana: Mediadores chegaram a Juba em 2 de abril para tentar resgatar o acordo de paz e prevenir uma nova guerra civil, em meio à escalada de tensões no país. Embora o acordo de paz tenha sido originalmente mediado em Doha, capital do Qatar, as negociações de reconciliação e esforços de implementação aconteceram principalmente em Juba. Para uma análise sobre outros impasses de negociações na região, veja nosso artigo sobre o conflito no leste da República Democrática do Congo e as dificuldades enfrentadas nas negociações de paz. Leia mais sobre o impasse nas negociações na RDC.
  • Nações Unidas: A UNMISS emitiu alerta de que o país está “à beira de relapsar em conflito generalizado” e pediu reforço de tropas de paz.

Impacto Econômico e Reconstrução

O conflito agrava um cenário econômico já frágil:

  • A infraestrutura petrolífera, principal fonte de receita, opera a capacidade reduzida após danos recorrentes ao oleoduto que atravessa o Sudão, levando a Petronas a anunciar sua saída em 9 de agosto de 2024, em razão dos custos de manutenção.
  • A insegurança desencoraja investimentos e retarda projetos de reconstrução de estradas, escolas e hospitais no Alto Nilo, elevando o desemprego e o acesso precário a serviços essenciais.

Perspectivas e Cenários Futuros

  1. Ruptura do Acordo de Paz: Sem monitoramento eficaz e garantias de proteção de civis, o R-ARCSS pode sucumbir a novas ondas de violência.
  2. Escalada Regional: Intervenções militares externas, como a de Uganda, podem polarizar ainda mais as divisões étnicas e envolver países vizinhos.
  3. Reforço de Missão de Paz: Caso o Conselho de Segurança da ONU autorize expansão da UNMISS, haveria aumento na capacidade de proteção de civis e mediação diplomática.

Conclusão

A recaptura de Nasir demonstra a capacidade militar do governo, mas expõe a fragilidade política e a urgência de uma solução sustentável. É imperativo combinar ações militares restritas com intenso diálogo político, proteção humanitária e compromissos econômicos para evitar retrocessos e consolidar a paz no Sudão do Sul.

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