Uganda restabelece julgamentos militares de civis com nova lei

Presidente de Uganda Yoweri Museveni fala na 42ª Sessão Extraordinária da IGAD em Entebbe, janeiro de 2024
O presidente de Uganda, Yoweri Museveni, durante seu discurso na 42ª Sessão Extraordinária da Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD), em Entebbe, Uganda, em 18 de janeiro de 2024. REUTERS/Abubaker Lubowa/File Photo

O Parlamento de Uganda aprovou na terça-feira, 20 de maio de 2025, uma emenda à legislação que autoriza tribunais militares a processar civis, em desrespeito a uma decisão da Suprema Corte de janeiro que havia declarado inconstitucionais tais julgamentos. A votação gerou protestos da oposição e de organizações de direitos humanos, que afirmam que a medida viola a Constituição e mina o Estado de Direito.

Contexto legal e números recentes

Em 31 de janeiro de 2025, a Suprema Corte de Uganda determinou que julgamentos de civis em cortes militares eram inconstitucionais, baseando-se no Artigo 28 da Constituição, que garante o direito a um julgamento justo e imparcial. Na ocasião, cerca de 2.000 civis permaneciam sob custódia militar, aguardando transferência para tribunais civis — alguns detidos há mais de quatro anos.

A decisão da Suprema Corte beneficiou figuras da oposição, como Kizza Besigye, ex-candidato presidencial acusado de traição, e criou expectativa de reforma imediata no sistema judicial.

Principais alterações da nova lei

A emenda aprovada restabelece a competência dos tribunais militares para julgar civis em casos relacionados a:

  • Segurança nacional (insurreição, sabotagem);
  • Contravenções militares (evasão de serviço, desrespeito a ordens);
  • Crimes graves (homicídio, terrorismo).

O coronel Chris Magezi, porta-voz das Forças de Defesa de Uganda, declarou que a lei “lidará de forma decisiva com criminosos violentos armados, deterá a formação de grupos militantes e garantirá a segurança nacional sobre bases sólidas”. O chefe militar, general Muhoozi Kainerugaba, saudou parlamentares: “Vocês provaram ser patriotas destemidos! Uganda lembrará sua coragem e compromisso”.

Reações internas e internacionais

Oposição e sociedade civil

Jonathan Odur, líder da bancada oposicionista, classificou a emenda como “superficial, irrazoável e inconstitucional”, afirmando que não há respaldo legal para julgar civis em cortes militares. Manifestações ocorreram em Kampala, com protestos exigindo o cumprimento da decisão judicial e respeito aos direitos fundamentais.

Organizações de direitos humanos

A Human Rights Watch criticou a ampliação do poder militar, afirmando que os tribunais “não atendem aos padrões internacionais de independência e imparcialidade, frequentemente baseando-se em provas obtidas sob tortura”. A ONG alertou que a medida pode agravar violações de direitos e restringir liberdades civis.

Comunidade internacional

Governo dos Estados Unidos e União Europeia expressaram preocupação, indicando que a lei pode afetar cooperações bilaterais em segurança e ajuda externa. Em declarações recentes, a Comissão Europeia avaliou revisões no apoio a projetos de justiça em Uganda caso persista a inobservância da decisão da Suprema Corte.

Impactos políticos, jurídicos e comparativos regionais

  • Erosão do Judiciário: O conflito institucional entre Legislativo e Suprema Corte pode enfraquecer a independência judicial.
  • Precedente regional: Em países como Nigéria e Zimbábue, tentativas de julgar civis em cortes militares geraram condenações de organismos multilaterais e cortes africanas de direitos humanos.
  • Clima de instabilidade: A incerteza jurídica pode intimidar opositores e frear a atividade política.

Próximos passos e urgência

A emenda seguirá para sanção do presidente Yoweri Museveni. Caso aprovada, entra em vigor imediatamente. A oposição já prepara recursos judiciais e mobilização de entidades civis para contestar a sanção. O prazo de 30 dias após a assinatura presidencial será decisivo para a resistência institucional e social.

Com esta lei, Uganda intensifica o papel das Forças Armadas em processos civis, gerando preocupações sobre a saúde democrática do país e a efetividade das garantias constitucionais.

Conclusão

A aprovação da nova lei que restaura os julgamentos militares para civis em Uganda representa um retrocesso significativo no campo dos direitos humanos e da justiça no país. Apesar da proibição imposta pela Suprema Corte em janeiro, o governo do presidente Yoweri Museveni demonstra uma firme intenção de manter o controle político por meio de instrumentos legais que restringem as garantias processuais básicas. A decisão pode ampliar a repressão contra opositores e enfraquecer ainda mais a confiança nas instituições democráticas. O cenário futuro dependerá da aprovação presidencial e da resposta da comunidade internacional, que acompanha com preocupação o avanço dessa medida. O debate sobre o equilíbrio entre segurança nacional e respeito aos direitos civis permanece, e a pressão por um sistema judicial justo e independente continua sendo essencial para o fortalecimento da democracia em Uganda.

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