África enfrenta risco de nova crise financeira: dívida crescente, retração de ajuda externa e instabilidade política preocupam especialistas

Vista aérea do moderno centro financeiro de Accra, Gana, com prédios comerciais e infraestrutura econômica.
O centro financeiro de Accra, em Gana, destaca-se como símbolo do crescimento econômico africano, refletindo investimentos e infraestrutura moderna no continente.

Uma análise publicada em setembro de 2025 pelo Financial Times, assinada por um ex-governador do Banco Central do Quênia, alerta para a crescente vulnerabilidade econômica da África. Apesar de ser um continente com algumas das economias de crescimento mais rápido do mundo, a África enfrenta fragilidades estruturais que podem levá-la a uma nova crise financeira com repercussões globais.

Endividamento em alta e custo crescente dos empréstimos

Nos últimos anos, diversos países africanos ampliaram significativamente sua dívida pública para financiar infraestrutura, programas sociais e enfrentar choques externos, como a pandemia da Covid-19 e a guerra na Ucrânia. No entanto, a combinação de juros internacionais mais altos e a valorização do dólar tornou o serviço da dívida cada vez mais oneroso. Nações como Gana, Zâmbia e Etiópia já enfrentam dificuldades para honrar compromissos, recorrendo a renegociações com credores internacionais.

De acordo com o Banco Mundial, a dívida pública média da África Subsaariana passou de cerca de 30% do PIB em 2010 para mais de 60% em 2024. Em alguns países, esse índice ultrapassa 90%, gerando receios de calotes em cadeia. Além disso, o pagamento da dívida externa da África em 2024 foi estimado em US$ 163 bilhões, mais de duas vezes e meia o valor de 2010, segundo o Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB).

Dependência da ajuda internacional em retração

Outro fator preocupante é a queda no volume de ajuda externa. Tradicionalmente dependentes de assistência internacional para equilibrar orçamentos e financiar projetos de desenvolvimento, vários governos africanos agora enfrentam cortes substanciais, especialmente vindos da Europa e dos Estados Unidos. A guerra na Ucrânia, a crise migratória e o fortalecimento de políticas internas de austeridade em países ocidentais levaram ao redirecionamento de recursos, deixando a África com menos apoio financeiro no momento em que mais precisa.

Instabilidade política e governança frágil

Além da questão econômica, a instabilidade política adiciona uma camada de risco. Golpes militares em países do Sahel, crises eleitorais em regiões estratégicas e governos enfraquecidos por corrupção e disputas internas dificultam a implementação de reformas estruturais. Em Uganda, por exemplo, cresce a incerteza em torno da sucessão do presidente Yoweri Museveni, enquanto no Sudão a guerra civil já destruiu parte significativa da economia nacional. Esses cenários reforçam a percepção de instabilidade e afastam investidores estrangeiros.

Repercussões globais

Uma crise financeira no continente africano não teria impacto apenas local. A África é vital para os mercados globais em setores como mineração, energia e agricultura. Interrupções econômicas poderiam afetar o fornecimento de minerais críticos — como cobalto e lítio, essenciais para a transição energética —, além de pressionar os preços internacionais de alimentos e combustíveis.

Ademais, um agravamento das dificuldades financeiras poderia ampliar fluxos migratórios em direção à Europa, gerar novas crises humanitárias e aumentar a influência de potências emergentes, como China e Rússia, que vêm expandindo presença econômica e militar na região.

Perspectivas e caminhos possíveis

Apesar dos riscos, há oportunidades. Economistas defendem que reformas fiscais, maior integração regional e estímulo ao investimento em setores estratégicos podem mitigar os efeitos de uma crise iminente. Iniciativas como a Zona de Livre Comércio Continental Africana (AfCFTA) oferecem potencial para fortalecer o comércio interno, reduzir dependências externas e criar um mercado mais resiliente.

A chave, segundo especialistas, será a capacidade dos governos africanos de equilibrar suas contas, melhorar a governança e buscar alianças internacionais que garantam não apenas alívio imediato da dívida, mas também uma base sólida para o crescimento sustentável.

Conclusão

A África enfrenta um momento crítico, em que dívidas elevadas, redução da ajuda internacional e instabilidade política podem desencadear uma crise financeira com impactos locais e globais. Ao mesmo tempo, reformas estruturais, integração econômica e políticas de governança eficiente oferecem caminhos para evitar o pior cenário. O futuro econômico do continente dependerá da capacidade de seus líderes de equilibrar responsabilidade fiscal, investimentos estratégicos e estabilidade política.

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