Alemanha precisa mais que dobrar seu exército para atender exigências da OTAN, afirma comandante

Soldados da Bundeswehr em uniforme de camuflagem alinhados no convés de um navio, com bandeiras da Alemanha e da ONU ao fundo, participando de missão da Força-Tarefa Marítima UNIFIL no Líbano.
Fuzileiros da Alemanha destacam-se em missões da ONU, incluindo a Força-Tarefa Marítima UNIFIL no Líbano. A Bundeswehr apoia a proteção da costa libanesa e o fortalecimento da marinha desde 2006.

A segurança europeia entrou em um novo patamar de tensão após o comandante do exército alemão afirmar que o país precisa mais do que dobrar seu efetivo militar para atender às exigências da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). A declaração, feita em meio à crescente instabilidade no leste europeu e à intensificação das incursões russas, levanta debates sobre a capacidade da Alemanha de assumir um papel de liderança na defesa do continente.

Contexto: o papel da Alemanha na defesa europeia

Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha manteve forças armadas de dimensões limitadas, fortemente condicionadas por sua Constituição pacifista e pela presença militar norte-americana em solo europeu. Com cerca de 62 mil soldados ativos, o Bundeswehr (exército alemão) tem enfrentado críticas constantes sobre falta de preparo, equipamentos defasados e incapacidade de responder a crises militares de grande escala.

No entanto, o cenário mudou drasticamente após a guerra na Ucrânia e as sucessivas ações agressivas da Rússia em território europeu. Em 2025, os riscos se ampliaram com a incursão de drones russos na Polônia, membro da OTAN, o que reforçou o alerta de que a Europa deve estar pronta para se defender sem depender exclusivamente dos Estados Unidos.

O diagnóstico do comandante alemão

O comandante do exército da Alemanha destacou que, para cumprir os compromissos assumidos dentro da OTAN, o país precisaria mais do que dobrar suas tropas ativas, possivelmente chegando a algo próximo de 150 mil soldados. Segundo ele, a meta não é apenas um aumento numérico, mas também uma modernização estrutural:

  • Capacitação tecnológica: drones de combate, sistemas de defesa antiaérea e armas de precisão.
  • Infraestrutura logística: transporte rápido de tropas em caso de conflito.
  • Efetivo humano: mais soldados bem treinados, com foco em operações conjuntas com aliados.

O alerta ecoa diretamente em Berlim, onde já há discussões sobre como financiar a ampliação das forças armadas, dado que o orçamento militar alemão está pressionado por outras demandas sociais e econômicas.

Pressão da OTAN e aliados europeus

A OTAN vem exigindo que seus membros destinem pelo menos 2% do PIB para defesa, meta que a Alemanha vinha historicamente descumprindo. Nos últimos anos, o país aumentou seu orçamento militar, mas ainda assim não alcançou o patamar considerado adequado pelos aliados.

Em 2022, após a invasão da Ucrânia pela Rússia, Berlim anunciou um fundo especial de 100 bilhões de euros para modernização militar. No entanto, boa parte desse valor ainda não foi utilizada, reforçando a crítica de que há uma distância entre promessas e execução prática.

Com a escalada das tensões, especialmente após a Rússia demonstrar capacidade de expandir seus ataques além da Ucrânia, a pressão sobre Berlim cresceu. A expectativa é de que a Alemanha, como maior economia da União Europeia, assuma protagonismo militar proporcional à sua força econômica.

Dilemas internos da Alemanha

Apesar da urgência, a proposta de ampliar drasticamente o exército enfrenta obstáculos internos:

  • Cultura pacifista: grande parte da sociedade alemã mantém resistência a políticas de militarização, reflexo da memória da Segunda Guerra.
  • Orçamento limitado: dobrar o tamanho do exército exigiria bilhões de euros adicionais em despesas anuais.
  • Desafios políticos: partidos de esquerda e verdes criticam fortemente o aumento de gastos militares, preferindo investimentos em diplomacia e transição energética.

Esses dilemas colocam o governo em posição delicada: por um lado, há a pressão internacional para que a Alemanha cumpra seu papel estratégico; por outro, internamente, o tema gera divisões políticas e sociais.

Impacto nas relações com França e Polônia

O fortalecimento militar alemão não afetaria apenas o equilíbrio interno da OTAN, mas também as relações de Berlim com seus vizinhos mais próximos.

  • França: como única potência nuclear da União Europeia, a França tradicionalmente ocupa a posição de principal força militar do bloco. Uma Alemanha com exército ampliado poderia rivalizar com Paris pela liderança estratégica europeia, gerando tensões políticas e uma possível competição por protagonismo dentro da UE.
  • Polônia: Varsóvia investiu pesadamente em defesa nos últimos anos e hoje é vista como a potência militar do leste europeu. Uma expansão significativa das forças alemãs ajudaria na contenção da Rússia, mas também poderia alimentar desconfianças históricas e disputar o espaço de liderança regional.

Analistas concordam que uma Alemanha mais forte militarmente é positiva para a defesa do continente, mas alertam que isso exigirá diplomacia ativa para evitar atritos com parceiros estratégicos e manter a coesão da União Europeia.

Implicações para a segurança europeia

Caso a Alemanha avance com esse plano, o impacto será profundo:

  • Fortalecimento da defesa da OTAN na Europa: um exército alemão ampliado reforçaria a capacidade de resposta a ameaças russas, especialmente na Polônia e nos Estados bálticos.
  • Redistribuição do peso militar europeu: a Alemanha passaria a rivalizar com a França em protagonismo militar, o que poderia alterar o equilíbrio interno da União Europeia.
  • Autonomia estratégica da Europa: com os EUA sob a administração de Donald Trump, que tem cobrado mais responsabilidade dos europeus na sua própria defesa, a medida seria um passo importante rumo à independência militar europeia.

Conclusão

A declaração do comandante alemão revela um ponto de inflexão para a segurança europeia. Dobrar — ou até triplicar — o tamanho do exército não é apenas uma questão de números, mas de redefinir o papel da Alemanha no mundo.

Diante de uma Rússia cada vez mais assertiva e de uma OTAN que cobra resultados, Berlim se vê forçada a repensar sua postura histórica de contenção militar. O futuro do continente pode depender de até onde a Alemanha está disposta a ir para proteger a si mesma e aos seus aliados.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*