
A Bolívia vive um momento político histórico após as eleições presidenciais realizadas no último domingo, 17 de agosto. Pela primeira vez em mais de duas décadas, o Movimento ao Socialismo (MAS), partido que dominou a política boliviana desde a ascensão de Evo Morales, não avançará para o segundo turno. Com 91% das urnas apuradas, a disputa final será entre Rodrigo Paz Pereira, do Partido Democrata Cristão (PDC), e Jorge “Tuto” Quiroga, ex-presidente e líder da aliança de direita Libre, marcando uma guinada histórica no cenário político do país.
Contexto histórico do MAS
O Movimento ao Socialismo (MAS), liderado por Evo Morales, esteve à frente da Bolívia por quase duas décadas, entre 2006 e 2025, consolidando um modelo econômico baseado em forte intervenção estatal, nacionalização de setores estratégicos como gás e mineração, e programas sociais voltados para redução da pobreza. Durante esse período, o MAS construiu uma base eleitoral sólida entre setores indígenas e urbanos, tornando-se o partido hegemônico da política boliviana. A ausência de Morales e de Arce nesta eleição abre espaço para uma mudança inédita na trajetória política do país.
Resultados preliminares e derrota histórica do MAS
Segundo os resultados divulgados pelo Tribunal Supremo Eleitoral, Rodrigo Paz lidera com 32,8% dos votos, seguido por Jorge Quiroga com 26,4%. O MAS, que governou a Bolívia por quase 20 anos, sofreu um revés dramático: Eduardo del Castillo, candidato oficial do partido, obteve apenas 3,16% dos votos, enquanto Andrónico Rodríguez, outro nome da esquerda, ficou em quarto lugar com cerca de 8%. A ausência do presidente Luis Arce e a impossibilidade legal de Evo Morales concorrer criaram um vácuo que abriu caminho para a oposição. Morales chegou a pedir voto nulo, gesto que contribuiu para reduzir a participação efetiva da base tradicional do MAS e consolidou a derrota histórica da legenda.
Contexto econômico e social
As eleições ocorreram em meio à pior crise econômica dos últimos 20 anos na Bolívia. Com inflação entre 24% e 25%, reservas cambiais pressionadas e desabastecimento crônico de combustíveis, a população vive um clima de incerteza. Relatórios recentes do FMI apontam vulnerabilidades fiscais e cambiais que exigem reformas urgentes, e a economia emergiu como tema central da campanha eleitoral.
O país também enfrenta desafios estratégicos em setores-chave, como o lítio. A Bolívia possui uma das maiores reservas globais desse mineral, essencial para baterias elétricas e a transição energética. O próximo presidente terá de decidir entre manter o controle estatal rígido ou abrir espaço para parcerias privadas e estrangeiras, decisão que poderá redefinir o posicionamento econômico internacional do país.
O segundo turno e o papel da juventude
O segundo turno será realizado em 19 de outubro de 2025, e todos os olhos estarão voltados para a capacidade de mobilização de eleitores em um cenário polarizado. Mais da metade do eleitorado tem até 35 anos, grupo decisivo que foi alvo de estratégias digitais, transmissões ao vivo e eventos que mesclam política e cultura. Apesar do engajamento online, especialistas alertam para o risco de abstenção, especialmente entre jovens desiludidos com os partidos tradicionais.
Rodrigo Paz apresenta um discurso moderado, focado em reformas econômicas graduais e estabilidade institucional. Já Jorge Quiroga aposta em uma agenda mais conservadora e liberal, defendendo abertura de mercados e acordos de livre comércio. A campanha do segundo turno promete ser acirrada, com debates intensos sobre economia, investimento estrangeiro e políticas sociais.
Implicações políticas
Analistas internacionais observam que esta eleição marca uma transição histórica. O MAS, partido hegemônico por quase duas décadas, viu sua base reduzir-se dramaticamente, e a política boliviana entra agora em um período de maior pluralidade. A transparência do processo será acompanhada por observadores internacionais, em meio ao risco de protestos caso o resultado seja apertado.
Para investidores e parceiros comerciais, o segundo turno será decisivo para entender a direção das reformas econômicas e políticas de abertura de mercado. A eleição de outubro não apenas definirá o presidente, mas também o rumo da economia boliviana e a posição estratégica do país na geopolítica do lítio.
Conclusão
As eleições de 2025 representam um divisor de águas para a Bolívia. Entre a crise econômica mais profunda em duas décadas, o potencial estratégico do lítio e a força da juventude nas urnas, o país enfrenta um momento de redefinição política. O segundo turno de outubro será mais do que uma escolha presidencial: será um teste sobre a capacidade da Bolívia de equilibrar estabilidade, desenvolvimento econômico e inclusão social em uma década decisiva para sua trajetória.
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