Exército do Sudão Afirma Ter Tomado o Palácio Presidencial em Cartum: O Impacto e as Implicações do Conflito

O edifício do Comando do Exército Sudanês apresenta marcas de bombardeios de artilharia em Cartum, Sudão, 26 de janeiro de 2025. REUTERS/El Tayeb Siddig/Arquivo.
O Comando do Exército Sudanês em Cartum, marcado pelos impactos de artilharia, evidenciando a intensificação do conflito no Sudão.REUTERS/El Tayeb Siddig/Arquivo.

O exército do Sudão anunciou na sexta-feira, 20 de março de 2025, que havia assumido o controle total do palácio presidencial em Cartum, a capital do país, em um importante avanço no conflito que já dura dois anos. O exército sudanês, que vinha enfrentando desafios no campo de batalha contra as Forças de Apoio Rápido (RSF), conseguiu retomar território crucial da paramilitar RSF, que tem exercido controle sobre vastas áreas do oeste do Sudão. No entanto, a vitória no palácio não significa o fim do conflito, e o país continua em um estado de guerra e instabilidade.

A Guerra no Sudão: Contexto e Desafios

A guerra no Sudão começou em 2023, quando as tensões entre o exército e as RSF, um grupo paramilitar formado em grande parte por milicianos originados de Darfur, se intensificaram. O conflito surgiu no momento em que o Sudão tentava transitar para um governo democrático, após a derrubada do regime de Omar al-Bashir em 2019. As Forças de Apoio Rápido e o exército estavam inicialmente aliados, mas as diferenças entre os líderes desses grupos, especialmente entre Abdel Fattah al-Burhan (líder do exército) e Mohamed Hamdan Dagalo (líder da RSF, conhecido como Hemedti), acabaram por desencadear uma guerra civil.

O controle do palácio presidencial é simbólico, mas não marca o fim do controle das RSF sobre partes significativas do país. Apesar de o exército ter tomado o palácio, as RSF continuam a operar nas imediações, com confrontos sangrentos ocorrendo em Cartum e outras regiões. Segundo fontes do exército, um ataque com drones das RSF matou vários soldados e três jornalistas da televisão estatal.

Impacto Regional do Conflito

O impacto do conflito sudanês vai além das fronteiras do país. O Sudão faz parte de uma região instável do Chifre da África, que inclui países como o Chade, o Egito e a Etiópia, todos diretamente afetados pelo que acontece no Sudão. O Chade, que já tem uma história de instabilidade política e conflito, teme o aumento de refugiados e a propagação de grupos armados. O Egito, por sua vez, está preocupado com o controle das águas do Nilo, sendo o Sudão um elo crucial na gestão do rio, vital para a segurança alimentar e hídrica do Egito. Além disso, a Etiópia, já envolvida em seu próprio conflito interno, também enfrenta um cenário de crescente insegurança nas suas fronteiras com o Sudão.

No âmbito internacional, a ONU e a União Africana têm chamado a atenção para a necessidade de mediação urgente. A ONU está preocupada com a crescente crise humanitária no Sudão, enquanto a União Africana tenta estabelecer um processo de negociação entre as facções em guerra, mas até o momento sem sucesso substancial.

Dados e Situação Humanitária

A crise humanitária no Sudão é uma das mais graves do século XXI. De acordo com a ONU, mais de 2,5 milhões de pessoas foram deslocadas internamente, e mais de 500 mil fugiram para os países vizinhos, como o Chade e a Etiópia. O número de vítimas fatais continua a crescer, com estimativas apontando para mais de 100 mil mortos desde o início do conflito. A fome e as doenças estão se espalhando rapidamente, com várias áreas do país enfrentando surtos de cólera e malária. Organizações humanitárias como a Cruz Vermelha e Médicos Sem Fronteiras estão trabalhando na linha de frente, mas o acesso à ajuda continua sendo um desafio devido à violência generalizada.

As Forças em Conflito

Ambos os lados do conflito — o exército e as RSF — têm sido acusados de crimes de guerra e violações dos direitos humanos. As RSF, em particular, enfrentam acusações de genocídio em Darfur, onde o grupo foi responsável por ataques brutais contra comunidades civis. O exército sudanês também tem sido criticado por sua condução da guerra e pelas mortes de civis durante os confrontos.

Especialistas em segurança internacional, como Ahmed Soliman, do Chatham House, observam que, embora o exército tenha obtido ganhos no centro do país, a RSF continua a manter posições fortes no oeste. Soliman acredita que o Sudão está caminhando para uma “realidade contestada e dividida”, onde o país pode acabar de fato se fragmentando.

Possíveis Soluções e O Futuro do Sudão

Com o avanço das forças armadas e a pressão crescente sobre as RSF, as possibilidades de uma resolução rápida permanecem incertas. A comunidade internacional tem intensificado os esforços para mediar uma solução diplomática, mas a falta de um diálogo genuíno entre as facções coloca um obstáculo significativo à paz. Organismos como a União Africana e a ONU tentam criar um canal de comunicação, mas a polarização entre os líderes militares dificulta um acordo duradouro.

Além disso, a comunidade internacional pode precisar considerar uma intervenção mais direta, seja por meio de uma força de paz ou de um embargo de armas mais rigoroso, para evitar que o conflito se alastre para os países vizinhos.

Conclusão

O controle do palácio presidencial em Cartum por parte do exército sudanês é um marco significativo, mas a guerra no Sudão ainda está longe de ser resolvida. O futuro do país dependerá das escolhas políticas internas, da mediação internacional e da dinâmica geopolítica regional. O impacto humanitário é imenso, e as perspectivas de uma divisão do país se tornam cada vez mais reais. As próximas semanas e meses serão cruciais para determinar se o Sudão poderá se reconstruir ou se continuará a viver com os efeitos de uma guerra devastadora e fragmentada.

Um porta-voz do exército sudanês faz uma declaração na TV Sudan, após, segundo o exército sudanês, assumirem o controle do palácio presidencial, em um local desconhecido, 21 de março de 2025. SUDAN TV/Divulgação via REUTERS.
Um porta-voz do exército sudanês faz uma declaração na TV Sudan, após, segundo o exército sudanês, assumirem o controle do palácio presidencial, em um local desconhecido, 21 de março de 2025. SUDAN TV/Divulgação via REUTERS.

Membros do exército sudanês filmam a si mesmos dentro do palácio presidencial, enquanto o exército sudanês afirma ter assumido o controle do edifício, em Cartum, Sudão, 21 de março de 2025, nesta captura de tela obtida de um vídeo nas redes sociais. Redes sociais via REUTERS.
Membros do exército sudanês filmam a si mesmos dentro do palácio presidencial, enquanto o exército sudanês afirma ter assumido o controle do edifício, em Cartum, Sudão, 21 de março de 2025, nesta captura de tela obtida de um vídeo nas redes sociais. Redes sociais via REUTERS.

Confira nossa última análise sobre o Sudão e os impactos do conflito.(União Africana Alerta para Risco de Partição do Sudão: Análise dos Desdobramentos do Conflito e suas Implicações)

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*