
A cúpula realizada em Pequim hoje, 24 de julho de 2025, para celebrar os 50 anos das relações diplomáticas entre China e União Europeia (UE), expôs o quão profundas permanecem as divisões entre os dois blocos. Longe de apontar para uma virada decisiva, o encontro confirmou que ainda não há vontade política suficiente para superar tensões estruturais em comércio e geopolítica.
Contexto político e diplomático
Local e formato
Inicialmente programada para Bruxelas, a reunião foi transferida para Pequim após recusa chinesa em sediá-la na capital europeia, sinalizando o endurecimento de Beijing. Além disso, o evento foi reduzido a apenas um dia, reflexo das disputas prévias sobre formato e agenda formal.
O impacto da volta de Donald Trump à presidência dos EUA
Com Donald Trump assumindo novamente a presidência em 2025, cresce a especulação sobre como sua abordagem menos ortodoxa e por vezes confrontacional às alianças transatlânticas pode influenciar as dinâmicas entre a China e a UE. Trump tem historicamente adotado uma postura comercial agressiva e cética quanto aos pactos multilaterais, o que dificulta qualquer esforço de aproximação entre China e Europa, mesmo que possa abrir novas janelas para negociações bilaterais com certos Estados‑membros.
Atritos comerciais: disputa estrutural
- Mecanismos de retaliação mútua
- Desde 2020, Pequim abriu sete investigações na OMC contra produtos europeus, enquanto a UE registrou onze casos contra a China — três deles durante o primeiro mandato de Trump, e outros seguindo com a retomada de seu governo em 2025.
- Setores em disputa
- Os principais capítulos dessas disputas envolvem veículos elétricos, equipamentos médicos, conhaque e controle de exportação de terras raras, temas centrais do modelo chinês de “nova força produtiva”.
- Déficit recorde
- A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, alertou que o déficit comercial da UE com a China atingiu €305,8 bilhões em 2024, evidenciando graves desequilíbrios e a necessidade de “soluções reais”.
A guerra na Ucrânia como catalisador de desconfiança
- Visões incompatíveis
Para Bruxelas, a postura chinesa frente à invasão russa de 2022 alimenta suspeitas de conivência. Já Beijing encara o conflito como “assunto europeu” e parte de uma estratégia de contenção estadunidense contra a China. - Dissonância diplomática
Apesar de tentativas de diálogo — inclusive visitas de líderes chineses à Europa —, persiste um impasse: a UE exige maior alinhamento de Beijing às sanções contra a Rússia, enquanto a China insiste em manter “neutralidade ativa”, aprofundando o mal-estar mútuo. - Táticas de duplo nível
Beijing adota simultaneamente retórica dura contra a UE e reforça laços com Estados‑membros mais simpáticos, como Hungria, na tentativa de fragmentar a coesão europeia.
Cenário transatlântico e perspectivas futuras
Aliança UE‑EUA em tempos de Trump
Com Trump no poder, a relação transatlântica enfrenta maior volatilidade. A UE se vê diante do desafio de gerir uma política externa pragmática, tentando evitar escaladas tarifárias e manter o diálogo comercial aberto, enquanto lida com pressões para reduzir a dependência econômica da China.
“Ponto de inflexão”
Von der Leyen afirmou que as relações estão em “ponto de inflexão”, guardadas as devidas proporções de urgência para um reequilíbrio de poderes entre os blocos.
Conclusão: em busca de um “novo normal”
A cúpula de Julho de 2025 deixou claro que China e UE estão longe de um entendimento estável. Sem disposição para flexibilizar suas estratégias — comerciais ou políticas —, os blocos devem construir um “novo normal” que não dependa de discursos repetidos, mas de acordos pragmáticos em áreas específicas (como clima e inovação). Só assim será possível transformar a desconexão atual em uma parceria funcional e duradoura.
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