
A menos de uma semana de completar seus primeiros 100 dias no comando da Alemanha, o chanceler Friedrich Merz já enfrenta uma crescente onda de críticas que ameaçam sua estabilidade política e a coesão de sua coalizão governista. A percepção pública e política sobre sua gestão ainda é marcada por dúvidas, principalmente devido a decisões controversas e uma aparente falta de proatividade diante de desafios econômicos e diplomáticos cruciais para o país.
O contexto político do início do governo Merz
Friedrich Merz, líder do Partido Democrático-Cristão (CDU), chegou ao poder com promessas de revitalizar a economia alemã, fortalecer as relações internacionais e restaurar a influência global da Alemanha. Seu governo é sustentado por uma coalizão que inclui a União Social-Cristã da Baviera (CSU) e os Democratas Livres (FDP). No entanto, apesar das expectativas iniciais, o que se vê até agora é uma administração enfrentando turbulências internas e críticas severas da oposição e da própria base aliada.
Segundo uma pesquisa recente do instituto INSA, a aprovação do governo Merz caiu para 38%, uma queda de 12 pontos percentuais desde a posse, reflexo direto das decisões controversas e da percepção de falta de ação em temas econômicos.
A suspensão das exportações de armas para Israel: uma decisão controversa
Um dos episódios mais recentes e emblemáticos que tem gerado desconforto dentro da coalizão foi a decisão unilateral do governo Merz de suspender as exportações de armas “usáveis em Gaza” para Israel. A medida, anunciada em meio à escalada do conflito no Oriente Médio, visava demonstrar um posicionamento cauteloso da Alemanha diante da guerra em Gaza, refletindo um equilíbrio delicado, como amplamente discutido no artigo [Alemanha congela exportação de armas ‘usáveis em Gaza’ — entre compromisso moral, pressão interna e nova geopolítica].
Contudo, a forma como a decisão foi conduzida — sem consultar previamente a CSU, principal aliada conservadora — provocou insatisfação e tensão. A CSU, historicamente próxima a Israel e com forte influência na política externa do governo, considerou a suspensão uma quebra de confiança e uma demonstração de falta de diálogo interno. Isso expôs fissuras na coalizão e levantou dúvidas sobre a capacidade de Merz em gerir alianças e consensos políticos.
Em resposta às críticas, Merz defendeu sua decisão, afirmando que a suspensão das exportações de armas visava evitar o uso de equipamentos militares alemães em operações militares em Gaza. Ele enfatizou que a Alemanha não poderia apoiar um conflito conduzido exclusivamente por meios militares e expressou o desejo de engajar-se diplomaticamente na resolução da crise. Apesar disso, reafirmou o compromisso da Alemanha com a segurança de Israel, destacando a responsabilidade histórica do país após o Holocausto.
Críticas externas: relação com os Estados Unidos e desafios econômicos
Além dos atritos internos, o governo Merz tem sido alvo de críticas no âmbito internacional, especialmente em relação à sua postura diante das tarifas comerciais impostas pelos Estados Unidos. Dados oficiais indicam que essas tarifas impactaram diretamente 15% das exportações alemãs para os EUA, afetando principalmente os setores automotivo e de maquinário pesado.
De acordo com o Instituto Alemão de Pesquisa Econômica (DIW Berlin), o aumento das tarifas deve reduzir o PIB alemão em 0,3% no próximo ano, elevando a preocupação entre especialistas e empresários.
Recentes dados da Associação Federal de Insolvências Empresariais mostram que, em julho de 2025, as insolvências cresceram 19,2% em relação ao mesmo período do ano anterior, refletindo o agravamento da situação econômica interna e a pressão sobre o mercado corporativo.
Impactos na popularidade e na estabilidade governamental
O conjunto desses fatores tem refletido na crescente impopularidade do chanceler. Pesquisas de opinião indicam que a confiança da população na gestão Merz está abaixo do esperado para o início de um mandato. Uma sondagem do instituto YouGov revelou que 54% dos entrevistados consideram que o governo não está respondendo adequadamente às crises econômicas e políticas.
Internamente, a pressão por maior transparência, diálogo e protagonismo tem crescido, sobretudo por parte da CSU, que ameaça até mesmo rever seu apoio à coalizão caso decisões cruciais continuem sendo tomadas sem consulta. Markus Söder, líder da CSU, declarou recentemente: “A confiança na liderança do governo depende da transparência e do respeito às alianças políticas. Não podemos aceitar decisões unilaterais que desestabilizem nossa cooperação.”
Propostas do governo para reverter o cenário
Ciente da delicada situação, o governo Merz anunciou um pacote de medidas para impulsionar a economia, que inclui incentivos fiscais para pequenas e médias empresas, estímulos à inovação tecnológica e fundos de apoio à exportação. O ministro da Economia, Robert Habeck, ressaltou: “Estamos focados em medidas concretas para proteger empregos e fortalecer a indústria, buscando também retomar o diálogo com nossos parceiros internacionais.”
Além disso, Merz declarou a intenção de criar um conselho consultivo para coordenar melhor as decisões políticas dentro da coalizão, visando evitar novos desgastes por falta de comunicação.
O desafio da liderança em tempos de crise
O cenário enfrentado pelo chanceler Merz exemplifica as dificuldades de governar um país com uma coalizão heterogênea e interesses divergentes em um contexto global de instabilidade. A gestão de crises, a capacidade de diálogo e a habilidade de negociação serão determinantes para a sustentabilidade de seu governo.
A suspensão das exportações de armas para Israel, embora possa ter sido motivada por uma tentativa de posicionar a Alemanha como um ator neutro e pacificador, revelou-se um erro de cálculo político pela falta de articulação interna. O episódio deixa claro que, para avançar, Merz precisará fortalecer canais de comunicação dentro de sua coalizão e equilibrar as demandas nacionais com a complexa geopolítica internacional.
Perspectivas para os próximos meses
Com o marco dos 100 dias quase atingido, o chanceler Merz está em um momento decisivo. Será necessário apresentar um plano robusto para enfrentar os desafios econômicos, principalmente as consequências das tarifas norte-americanas e o aumento das insolvências empresariais. Simultaneamente, deverá conduzir com mais diplomacia as questões internacionais delicadas, como o conflito no Oriente Médio, para evitar rupturas internas e manter o apoio da coalizão.
A manutenção da estabilidade política dependerá da habilidade de Merz em conciliar as demandas de seus aliados e da população, recuperando a confiança perdida. A Alemanha, enquanto potência europeia, espera do seu governo uma postura firme e articulada que assegure crescimento econômico e posição influente no cenário global.
Conclusão
Os primeiros 100 dias do governo Friedrich Merz refletem os desafios complexos de liderar a Alemanha em um momento marcado por tensões internas e externas. Entre a queda na popularidade, as disputas dentro da coalizão e os impactos econômicos causados por tarifas estrangeiras, o chanceler precisa equilibrar decisões delicadas, tanto no campo político quanto diplomático.
A suspensão das exportações de armas para Israel exemplifica os dilemas morais e estratégicos enfrentados, enquanto as críticas internas ressaltam a necessidade urgente de maior diálogo e transparência. Para avançar, Merz deverá não apenas apresentar soluções econômicas eficazes, mas também fortalecer sua base política, reconstruindo a confiança perdida.
O futuro do governo dependerá da capacidade de conciliar interesses divergentes e demonstrar uma liderança coesa, capaz de garantir estabilidade e projeção internacional para a Alemanha. Este período inicial, turbulento, pode servir como base para ajustes necessários que definirão o sucesso ou o fracasso da gestão Merz nos próximos anos.
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