
Em reação ao ataque de 22 de abril que matou 26 turistas em Caxemira — atribuído por Nova Délhi a militantes vindos do Paquistão — o governo indiano suspendeu, em abril de 2025, o Tratado de Águas do Indo de 1960. A partir dessa decisão, acelerou em vários meses o cronograma de quatro grandes usinas em construção na bacia do rio Chenab, conforme documento interno do Ministério de Energia revisado pela Reuters e declaração de fonte da indústria .
Contexto histórico e geopolítico
O Tratado de Águas do Indo, assinado em setembro de 1960 e mediado pelo Banco Mundial, definiu a partilha das águas dos rios Indo, Chenab e Jhelum. Pelo acordo, o Paquistão passou a receber cerca de 80% do fluxo combinado, garantindo sua agricultura e geração hidrelétrica. A suspensão unilateral por parte da Índia representa ruptura sem precedentes e ferramenta de pressão estratégica num histórico de conflitos regionais .
Detalhes dos projetos antecipados
O documento do Ministério de Energia lista quatro usinas cujas datas de início foram antecipadas:
- Pakal Dul (1.000 MW) — previsto para junho de 2026.
- Kiru (624 MW) — agosto de 2026.
- Kwar (540 MW) — dezembro de 2027.
- Ratle (850 MW) — agosto de 2028.
Operadas pela estatal NHPC, todas são do tipo “run‑of‑river” (sem grandes reservatórios). Autoridades indianas instruíram agências de segurança, meio ambiente e trabalho a eliminar entraves regulatórios e logísticos para acelerar as obras .
Reações e riscos
- Paquistão: a Autoridade do Sistema de Irrigação do Indo (IRSA) reportou variações de até 90% no fluxo do Chenab em Marala desde o fim de semana, apontando manobras indianas em usinas como causa principal . O órgão ativou reservatórios a jusante para mitigar escassez de água para a estação de cultivo de verão.
- Índia: o ministro das Águas declarou que “nem uma gota do Indo chegará ao Paquistão” enquanto durar a suspensão do tratado. O governo de Narendra Modi justifica a medida pela necessidade de atender à crescente demanda por energia limpa e pela urgência de registrar dados detalhados de novos projetos antes de qualquer renegociação .
- Especialistas: analistas em recursos hídricos alertam que, mesmo sem grandes reservatórios, as flutuações bruscas de fluxo — ao parar e liberar água — podem danificar canais de irrigação e comprometer colheitas no Paquistão, gerando impactos socioeconômicos severos. Há ainda o risco de escalada militar, caso Islamabad interprete a pressão hídrica como provocação maior .
Reações internacionais
Até o momento, nem Estados Unidos nem China emitiram declarações oficiais contundentes, mas analistas apontam que Washington monitora a situação por temer instabilidade nuclear na região, enquanto Pequim observa o episódio como parâmetro para suas próprias disputas transfronteiriças de água. A União Europeia já manifestou preocupação com o uso político de recursos hídricos e defendeu a retomada do diálogo bilateral .
Impacto ambiental e humanitário
O controle do fluxo do Chenab afeta ecossistemas aquáticos e populações ribeirinhas. Biólogos alertam para riscos à fauna migratória e à qualidade da água, além de danos a pequenos agricultores que dependem de irrigação constante. No Paquistão, estima-se que até 15 milhões de pessoas possam sofrer com racionamento durante a próxima estação seca, elevando potencial para crise humanitária local .
Caminhos para mediação
Organismos como a ONU e o Banco Mundial são citados como possíveis mediadores. A Corte Permanente de Arbitragem, em Haia, já analisa disputa sobre o projeto Ratle; novos pleitos podem atrasar obras e pressionar por soluções negociadas. Especialistas recomendam criação de um comitê trilateral (Índia–Paquistão–Banco Mundial) para monitorar fluxos e retomar mecanismos de compartilhamento de dados em tempo real, como discutido em Tensões Índia-Paquistão Sob Olhar da ONU: Guterres Oferece ‘Boas Oficinas’ para Evitar Confronto.
Conclusão
A aceleração dos projetos hidrelétricos em Caxemira demonstra a estratégia da Índia de usar recursos hídricos como alavanca de poder geopolítico. Ao suspender o Tratado de Águas do Indo, Nova Délhi busca atender à sua demanda energética e ganhar posição de negociação, mas assume o risco de agravar a crise humanitária no Paquistão e de desencadear uma escalada militar. A disputa no Chenab emerge como um ponto crítico onde a água se torna arma — e potencial catalisador de conflito nuclear.

O Tratado das Águas do Indo (1960) é um acordo entre Índia e Paquistão para dividir o uso dos rios da Bacia do Indo. O tratado foi estabelecido para resolver disputas sobre o uso da água, uma questão vital para os dois países, especialmente em uma região com escassez de recursos hídricos. O tratado atribui:
- Rios Ocidentais (Indus, Jhelum, Chenab) ao Paquistão.
- Rios Orientais (Ravi, Beas, Sutlej) à Índia.
Embora a Índia tenha o direito de usar água dos rios ocidentais, isso é permitido apenas para usos não-consuntivos, como a geração de energia hidrelétrica, e sempre sob supervisão internacional, conforme as diretrizes do tratado.
Geografia dos Rios e Países Envolvidos
A Bacia do Indo abrange partes da Índia, Paquistão, China, Afeganistão e Nepal. O sistema fluvial é composto por vários rios principais e afluentes, sendo crucial para a agricultura e produção de energia nos países envolvidos.
- Rio Indo: O Indo nasce no Tibete (China), atravessa a Índia (Ladakh) e flui pelo Paquistão até o Mar Arábico.
- Afluentes Principais: Jhelum, Chenab, Ravi, Beas e Sutlej.
Países Vizinhos e sua Relação com a Bacia
- China: Controla a região do Tibete, onde o Indo nasce.
- Afeganistão: Contribui com pequenos afluentes na fronteira noroeste.
- Nepal: Embora não diretamente na bacia do Indo, sua proximidade geográfica o inclui no contexto regional.
Divisão Política no Mapa
- Índia: Representada por Nova Delhi (capital) e Srinagar (capital de Jammu e Caxemira, região estratégica para recursos hídricos).
- Paquistão: Inclui Islamabad (capital) e Karachi (maior cidade e porto, dependente do Indo para abastecimento de água e agricultura).
- Áreas Disputadas: A região da Caxemira é particularmente importante, pois abriga nascentes de rios essenciais para o tratado, como os rios Jhelum e Chenab.
Cidades-Chave
- Islamabad (Paquistão): Sede administrativa, onde o governo paquistanês gerencia projetos relacionados aos rios do Indo.
- Srinagar (Índia): Localizada em Jammu e Caxemira, essa cidade é estratégica devido à proximidade com os rios Jhelum e Chenab.
- Nova Delhi (Índia): Coordena as políticas hídricas relacionadas aos rios orientais e aos projetos de infraestrutura de hidrelétricas.
- Karachi (Paquistão): A cidade depende diretamente do Indo para abastecimento de água e irrigação, sendo vital para a economia agrícola do Paquistão.
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