
No sábado, 10 de maio de 2025, o ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbas Araqchi, declarou em Doha que Teerã não abrirá mão de “nenhum de nossos direitos nucleares” — uma mensagem direta aos Estados Unidos pouco antes de uma nova rodada de conversações indiretas, mediadas por Omã, sobre o programa nuclear iraniano.
Contexto das Negociações
As conversas, já na sua quarta rodada, têm sido realizadas em formato indireto: cada delegação permanece em salas separadas, trocando propostas por intermédio de mediadores omanenses. O enviado especial dos EUA, Steve Witkoff, tem exigido a desmontagem completa das instalações de enriquecimento de urânio de nível civil e potencialmente militar — incluindo Natanz, Fordow e Isfahan —, uma postura que rompe com os termos do Plano de Ação Conjunto Global de 2015, que permitia enriquecimento limitado até 3,67%.
Por sua vez, Teerã insiste que seu programa tem fins estritamente pacíficos e se apoia no Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), que garante a todos os signatários o direito ao uso de tecnologia nuclear para fins civis, sob supervisão da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica). Esta divergência de entendimento sobre o que constitui “direito” e “limite” está no cerne do impasse.
Fundamentação Jurídica e Técnica
Segundo especialistas em direito internacional, o TNP (enxertado em 1970) confere a Estados não detentores de armas nucleares o direito soberano de desenvolver atividades nucleares pacíficas, desde que cumpram obrigações de transparência e inspeção pela AIEA. O Irã, signatário desde 1970, reforça que suas instalações estão abertas a auditorias e que sua expansão de capacidade visa suprir demandas energéticas e médicas internas, não a fabricação de armas.
Entretanto, a Administração Trump adotou em 2018 uma política de “pressão máxima”, revertendo a abertura do JCPOA de 2015 e impondo sanções severas que afetam desde exportações de petróleo até transações bancárias internacionais. Para Washington, o simples potencial de enriquecimento acima de certos patamares representa risco de quebra de contenção e “linha vermelha” para proliferação.
Análise Geopolítica
A recusa iraniana em transferir seu estoque de urânio altamente enriquecido para um país terceiro — proposta norte-americana-chave — reflete não apenas uma questão técnica, mas uma distrust profunda em garantias externas, após a retirada unilateral dos EUA do acordo em 2018. Tehran teme que, uma vez fora de suas fronteiras, tal material possa ser retido caso o cenário político mude novamente, deixando o Irã vulnerável.
Além disso, Araqchi aproveitou sua passagem por Doha para reforçar alianças regionais, participando do Diálogo Irã‑Mundo Árabe e articulando apoio político entre vizinhos do Golfo antes do encontro em Omã. Esse movimento sublinha a estratégia iraniana de vincular sua política nuclear a uma agenda de segurança regional mais ampla, envolvendo Arábia Saudita, Qatar e demais atores.
Possíveis Cenários de Desfecho
- Acordo Parcial de Curto Prazo: o Irã concorda em limitar temporariamente o enriquecimento, em troca de liberação de ativos financeiros congelados e algum alívio em sanções, sem demolir sua infraestrutura nuclear.
- Impasse Prolongado: Washington mantém exigências rígidas e Teerã adota novas contramedidas (aumento de enriquecimento e redução de inspeções), elevando tensões e risco de confrontos indiretos.
- Impasse Prolongado: Washington mantém exigências rígidas e Teerã adota novas contramedidas (aumento de enriquecimento e redução de inspeções), elevando tensões e risco de confrontos indiretos.
Segundo analistas, o fator-chave será a elasticidade política de ambos os lados: até que ponto Trump aceitará um enriquecimento limitado, e até onde o Irã está disposto a abrir mão de garantias absolutas sobre seu programa civil. A inclusão de especialistas técnicos na delegação iraniana sugere que Teerã buscará propostas detalhadas e alternativas de verificação que não impliquem perda de soberania sobre seu material nuclear.
Implicações para a Segurança Internacional
Um acordo que permita ao Irã manter parte de sua capacidade de enriquecimento, mas sob um regime de inspeção mais robusto, poderia desanuviar tensões no Oriente Médio, reduzir o risco de corrida armamentista na região e reestabelecer canais de cooperação econômica. Por outro lado, um fracasso nas negociações elevaria o espectro de retaliações — tanto por parte dos EUA quanto de aliados árabes preocupados com o avanço nuclear iraniano — e abriria caminho para cenários militares.
Para a União Europeia e a ONU, o ideal seria uma solução de compromisso que recoloque o Irã no JCPOA revisado, com garantias multilaterais, sem apagar completamente o programa nuclear civil de Teerã. Observadores destacam que o papel de Omã como mediador tem sido fundamental para manter o diálogo, funcionando como “ponte de confiança” entre dois polos de desconfiança histórica.
Conclusão
A afirmação de Araqchi em Doha — que o Irã não cederá em seus “direitos nucleares” — deixa claro que qualquer avanço dependerá de flexibilidade mútua: os EUA terão de moderar suas exigências de desmantelamento, enquanto o Irã precisará oferecer novos mecanismos de verificação que satisfaçam as preocupações de não proliferação.
Nesta encruzilhada, as negociações em Omã poderão definir se o mundo caminha rumo a um novo entendimento nuclear, equilibrando soberania e segurança, ou se o impasse se transformará em mais um capítulo de tensão no já volátil tabuleiro do Oriente Médio.
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