
Negociações sob tensão: o preço da confiança
Em 18 de abril de 2025, um alto funcionário iraniano revelou à Reuters que o Irã está disposto a aceitar alguns limites no enriquecimento de urânio, mas apenas mediante garantias legais de que o presidente Donald Trump não repetirá a saída abrupta do JCPOA em 2018. A segunda rodada de conversas, marcada para Roma, sucede negociações iniciais “positivas” em Omã, mas o ceticismo mútuo persiste.
Origens do impasse: do JCPOA ao “maximum pressure”
O Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA) de 2015, firmado entre Irã e as potências do P5+1, limitava o programa nuclear persa em troca da retirada gradual de sanções. Em maio de 2018, Trump anunciou a saída unilateral dos EUA, reinstituindo sanções que atingiram duramente o setor petrolífero e financeiro iraniano. Desde então, Teerã ultrapassou os limites de urânio enriquecido e restringiu parcialmente o acesso da AIEA às suas instalações.
As “linhas vermelhas” de Teerã
Sob diretriz direta do Aiatolá Ali Khamenei, o Irã não abrirá mão de:
- Desmantelar centrífugas já operacionais;
- Suspender completamente o enriquecimento de urânio;
- Reduzir o estoque de urânio abaixo dos níveis de 2015;
- Negociar seu programa de mísseis balísticos.
Balanço das rodadas: Omã e Roma
Na primeira rodada em Mascate, Omã, ambas as delegações descreveram o diálogo como “produtivo” e “calmo”. Araqchi enfatizou que o começo foi promissor, mas alertou para exigências americanas “irrealistas”. A expectativa agora se volta ao encontro em Roma, onde se tentarão avançar em detalhes sobre inspeções da AIEA e cronogramas de suspensão de sanções.
Termos um artigo falando sobre isso:Irã e Estados Unidos retomam negociações nucleares após sete anos: o que está em jogo?
Posições em confronto
- Irã: quer suspensão imediata das sanções contra petróleo e finanças, em troca de supervisão contínua pela AIEA para comprovar fins pacíficos.
- EUA: exigem o fim total do enriquecimento para retomar negociações substantivas, postura considerada “linha vermelha” por Teerã.
Perspectiva da comunidade internacional
A União Europeia mantém-se cautelosa. Embora tenha participado ativamente no JCPOA original, teme agora ficar à margem das negociações conduzidas exclusivamente pelos EUA e pelo Irã. Analistas ressaltam que uma estratégia coordenada com Bruxelas é essencial para aumentar a pressão diplomática e garantir maior estabilidade no acordo.
A AIEA, por sua vez, alerta que o tempo está se esgotando para se alcançar um acordo antes que Irã atinja níveis de enriquecimento próximos ao grau militar, segundo o diretor-geral Rafael Grossi.
A Rússia declarou-se disposta a mediar e apoiar um entendimento que restrinja o debate ao âmbito nuclear, descartando imposições sobre o programa de mísseis e reforçando o direito iraniano à energia atômica pacífica.
Histórico da diplomacia nuclear
Desde a entrada em vigor do Tratado de Não‑Proliferação Nuclear (TNP) em 1970, o Irã comprometeu-se como Estado não‑nuclear a não desenvolver armas atômicas, autorizando inspeções da AIEA.
Em 2002, denúncias de instalações não declaradas em Natanz e Arak levaram a tensões crescentes, resultando em sanções do Conselho de Segurança da ONU. O JCPOA de 2015 foi a culminância de anos de debates multilaterais, mas sua desintegração em 2018 inaugurou um ciclo de violações mútuas e acirramento de retóricas. A história mostra que acordos parciais sem garantias duradouras dificilmente resistem a alterações de governo nos EUA ou no Irã.
Tensão no Golfo Pérsico
O Golfo Pérsico é palco de rivalidades históricas:
- Arábia Saudita e Emirados Árabes vêem o avanço nuclear iraniano como ameaça direta, apoiando iniciativas de segurança saudita‑ocidentais;
- Incidentes navais e ataques a petroleiros elevaram o risco de uma escalada militar, ganhando atenção global.
Qualquer rompimento nas negociações pode desencadear retaliações assimétricas, impactando o tráfego de petróleo e aumentando a volatilidade dos preços globais.
Conclusão: entre o ceticismo e a urgência
A demanda iraniana por garantias legais contra futuras saídas americanas reflete um déficit de confiança construído por anos de “pressão máxima”. Sem um mecanismo que vincule compromissos a mudanças de governo em Washington, a perspectiva de um acordo sólido continua incerta. A comunidade internacional — especialmente UE, AIEA e Rússia — pode oferecer mecanismos de checagem e contrapesos que aumentem a robustez do pacto. No entanto, a sombra de Trump e a instabilidade no Golfo do Pérsico mantêm as negociações no limiar entre o sucesso diplomático e o fracasso que alimentaria novos conflitos.
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