
Em 20 de abril de 2025, o Exército do Sudão do Sul (SSPDF) anunciou a recaptura de Nasir, cidade estratégica do estado do Alto Nilo, ocupada pela milícia White Army desde 4 de março. Este artigo detalha o contexto político, as reações internacionais, os impactos humanitários e econômicos, além de reunir análises de especialistas e relatos de civis para oferecer um panorama completo e robusto dos desdobramentos.
Contexto Histórico e Crise de Março de 2025
Após o acordo de paz de agosto de 2018, que encerrou a guerra civil de 2013–2018 e estabeleceu um governo de partilha entre o presidente Salva Kiir (Dinka) e o vice‑presidente Riek Machar (Nuer), tensões étnicas persistiram. Em 4 de março de 2025, o White Army — grupo de jovens Nuer acusado de ligação a Machar — tomou a guarnição de Nasir, levando à prisão domiciliar de políticos do SPLM‑IO e elevando temores de um novo conflito étnico em grande escala.
A Operação de Retomada de Nasir
Segundo o porta‑voz do SSPDF, Lul Ruai Koang, o avanço foi realizado sem combates diretos em Nasir. O apoio aéreo próximo permitiu detectar e dispersar uma possível emboscada em Thuluc, antes de a milícia se reagrupar, evitando confronto frontal porém resultando em 17 mortes de civis durante bombardeios nesta aldeia vizinha.
Citações de Especialistas
- Daniel Akech, analista sênior do International Crisis Group, alerta que “as tensões étnicas não resolvidas e a fragilidade do acordo de paz aumentam significativamente o risco de um novo conflito em grande escala no Alto Nilo”.
- Nyagoah Tut Pur, pesquisador da Human Rights Watch, destaca: “O uso de armas incendiárias em áreas povoadas tem causado mortes horríveis e ferimentos graves, especialmente em crianças, configurando potencial crime de guerra”.
Vozes de Nasir e das Vítimas
Relatos de ONGs e civis fornecem um aspecto humano essencial:
- Moradores de Thuluc contam que, durante o bombardeio, “as chamas consumiram casas e campos, deixando famílias sem abrigo em plena noite”.
- Pal Mai Deng, porta‑voz do SPLM‑IO, afirmou que o partido exige “investigação internacional sobre relatos de uso de armas químicas e incendiárias pelo governo” na região.
Estimativas da ONU indicam mais de 50.000 deslocados desde o início das hostilidades, com falta de água, alimentos e atendimentos médicos básicos nas áreas afetadas.
Ações Regionais e Diplomacia
- IGAD: O secretário executivo Dr. Workneh Gebeyehu exigiu “máxima contenção e reconfirmação de compromisso com o Acordo R-ARCSS, priorizando o diálogo”.
- União Africana: Mediadores chegaram a Juba em 2 de abril para tentar resgatar o acordo de paz e prevenir uma nova guerra civil, em meio à escalada de tensões no país. Embora o acordo de paz tenha sido originalmente mediado em Doha, capital do Qatar, as negociações de reconciliação e esforços de implementação aconteceram principalmente em Juba. Para uma análise sobre outros impasses de negociações na região, veja nosso artigo sobre o conflito no leste da República Democrática do Congo e as dificuldades enfrentadas nas negociações de paz. Leia mais sobre o impasse nas negociações na RDC.
- Nações Unidas: A UNMISS emitiu alerta de que o país está “à beira de relapsar em conflito generalizado” e pediu reforço de tropas de paz.
Impacto Econômico e Reconstrução
O conflito agrava um cenário econômico já frágil:
- A infraestrutura petrolífera, principal fonte de receita, opera a capacidade reduzida após danos recorrentes ao oleoduto que atravessa o Sudão, levando a Petronas a anunciar sua saída em 9 de agosto de 2024, em razão dos custos de manutenção.
- A insegurança desencoraja investimentos e retarda projetos de reconstrução de estradas, escolas e hospitais no Alto Nilo, elevando o desemprego e o acesso precário a serviços essenciais.
Perspectivas e Cenários Futuros
- Ruptura do Acordo de Paz: Sem monitoramento eficaz e garantias de proteção de civis, o R-ARCSS pode sucumbir a novas ondas de violência.
- Escalada Regional: Intervenções militares externas, como a de Uganda, podem polarizar ainda mais as divisões étnicas e envolver países vizinhos.
- Reforço de Missão de Paz: Caso o Conselho de Segurança da ONU autorize expansão da UNMISS, haveria aumento na capacidade de proteção de civis e mediação diplomática.
Conclusão
A recaptura de Nasir demonstra a capacidade militar do governo, mas expõe a fragilidade política e a urgência de uma solução sustentável. É imperativo combinar ações militares restritas com intenso diálogo político, proteção humanitária e compromissos econômicos para evitar retrocessos e consolidar a paz no Sudão do Sul.
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