
Nos últimos anos, a região do Sahel consolidou-se como o novo epicentro global do terrorismo, com grupos jihadistas aproveitando-se da instabilidade política, das fronteiras porosas e da pobreza extrema para ampliar sua atuação. A Nigéria, país mais populoso da África e maior economia do continente, está respondendo de forma robusta ao ressurgimento do Boko Haram e ao fortalecimento do Estado Islâmico na África Ocidental (ISWAP), por meio de um ambicioso programa de expansão e modernização de sua Força Aérea (NAF).
Panorama operacional e necessidade de modernização
O Boko Haram, ativo desde 2009, já causou mais de 40 mil mortes e deslocou milhões de pessoas no nordeste da Nigéria. O ISWAP, dissidência do Boko Haram, intensificou ataques com táticas mais sofisticadas, incluindo o uso de drones carregados de explosivos para alvejar bases militares e vilarejos. Apesar dos sucessos pontuais da NAF no apoio aéreo próximo e no reconhecimento, sua frota envelhecida — muita dela herdada da Guerra Fria — limitava o alcance, a capacidade de carga e a precisão dos ataques.
O General Ibrahim Attahiru, ex-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas Nigerianas, destacou em entrevista recente:
“Sem a modernização da nossa Força Aérea, não conseguiríamos responder com eficácia às ameaças multifacetadas que enfrentamos no nordeste. A tecnologia aérea é um multiplicador de força essencial para manter a segurança da população.”.
Principais aquisições e investimentos
Caças M-346 e helicópteros AW-109 Trekker
Em outubro de 2024, a Nigéria firmou contrato para adquirir 24 caças de treinamento/ataque leve M-346 e 10 helicópteros AW-109 Trekker, ambos da italiana Leonardo. Os três primeiros M-346 devem ser entregues no início de 2025, com o lote completo até meados de 2026. Para viabilizar a compra de seis desses jatos, o governo aprovou empréstimo de US$ 618 milhões junto a bancos internacionais. Além disso, planeja instalar um centro de manutenção local para dar suporte à nova frota.
A-29 Super Tucano e drones Wing Loong II
Paralelamente, a NAF já recebeu diversas aeronaves A-29 Super Tucano de fabricação americana, ideais para missões de contra-insurgência em ambientes hostis. Há também pedidos em negociação para aquisição de drones Wing Loong II chineses, que devem reforçar a capacidade de vigilância e ataque de precisão em áreas remotas.
Centros de manutenção e treinamento
O programa inclui ainda a construção de um hub de manutenção em Kaduna e a formação de pilotos e tripulações em escolas especializadas na Itália e nos Estados Unidos, visando reduzir dependência externa e garantir rápida disponibilidade operacional.
Inteligência integrada: o papel decisivo no combate assimétrico
A utilização integrada de inteligência de sinais (SIGINT) e inteligência humana (HUMINT) tem sido fundamental para o sucesso das operações aéreas. A Agência Nacional de Inteligência da Nigéria (NIA) trabalha em estreita colaboração com a Força Aérea para detectar movimentos suspeitos, identificar rotas e antecipar ataques.
O Coronel John Okoro, especialista em inteligência militar, explica:
“A força aérea moderna depende não só do poder de fogo, mas da qualidade da informação. Sem inteligência precisa, os ataques aéreos podem ser ineficazes ou até causar danos colaterais. Por isso, o investimento em SIGINT e HUMINT mudou o jogo para as forças nigerianas.”
Expansão da capacidade operacional e impacto humanitário
Com as novas aquisições, a NAF aumentou o raio de ação das missões, melhorou a precisão dos ataques e elevou a persistência aérea. Isso resultou em uma redução de até 30% na movimentação de comboios do Boko Haram no estado de Borno e em outras regiões afetadas.
Além dos ganhos militares, a ampliação da capacidade aérea teve impacto direto na proteção da população civil. Segundo dados do Conselho Nacional de Gestão de Emergências da Nigéria (NEMA), o número de civis deslocados por ataques terroristas no nordeste caiu 15% em 2024, refletindo a diminuição das incursões insurgentes graças à presença constante da NAF.
Reação e adaptação dos grupos terroristas
Os grupos jihadistas não ficaram estáticos diante da expansão aérea nigeriana. O ISWAP, em particular, tem demonstrado capacidade adaptativa, lançando ataques noturnos com drones improvisados e emboscadas em terrenos de difícil acesso, evitando grandes concentrações que possam ser alvos fáceis da aviação.
Analistas da Fundação para Estudos de Segurança Africana (AFSS) comentam:
“O conflito no Sahel é dinâmico. Enquanto a Nigéria moderniza sua força aérea, os terroristas investem em táticas de guerra irregular, criando um ciclo contínuo de ação e reação.”
Cooperação regional e internacional
Para maximizar o impacto, a Nigéria reforçou parcerias com:
- Estados Unidos: compartilhamento de inteligência e treinamento em guerra eletrônica;
- Itália (Leonardo): suporte técnico e transferência de know-how para o centro de manutenção;
- CEDEAO e G5 Sahel: coordenação de patrulhas transfronteiriças e exercícios conjuntos.
Exercícios trilaterais e multinacionais, como o Flintlock 2025, têm aprimorado a interoperabilidade e acelerado o intercâmbio de lições aprendidas.
Impacto esperado e perspectivas
A modernização da NAF eleva a Nigéria a um papel de liderança na defesa aérea e contra-terrorismo na África Ocidental. Espera-se que:
- Desestimule ataques transfronteiriços e ofereça apoio rápido a países vizinhos;
- Retrate a confiança pública no Governo Federal, mostrando capacidade de proteger civis;
- Inspire outros países da região a investirem em aviação militar e inteligência.
Entretanto, analistas advertem que apenas a resposta militar não basta. É crucial integrar ações de desenvolvimento social, justiça pós-conflito e recomposição de vínculos comunitários para atacar as raízes do extremismo e consolidar uma paz duradoura.
Conclusão
A expansão e modernização da Força Aérea Nigeriana representam um avanço estratégico fundamental na luta contra o terrorismo no Sahel, especialmente frente às ameaças do Boko Haram e do ISWAP. Com a aquisição de aeronaves modernas, o fortalecimento da inteligência integrada e a cooperação internacional, a Nigéria ampliou sua capacidade de resposta rápida e precisa, o que já tem gerado impactos positivos na redução da atividade insurgente e na proteção de civis.
No entanto, a dinâmica do conflito, marcada pela adaptação contínua dos grupos terroristas, reforça a necessidade de uma abordagem multidimensional que combine poder militar com estratégias sociais, políticas e econômicas. Somente assim será possível construir uma paz sustentável e restaurar a estabilidade em uma das regiões mais afetadas pela violência no mundo.
A Nigéria, ao investir decisivamente em sua aviação militar e inteligência, assume um papel de liderança regional, mostrando que a modernização das forças armadas é uma peça-chave para garantir a segurança e o desenvolvimento no continente africano.
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