
Em 30 de maio de 2025, o Paquistão anunciou a decisão de designar um embaixador em Cabul — o primeiro desde a tomada de poder pelos talibãs em 15 de agosto de 2021. A medida representa uma elevação do nível de representação diplomática e sinaliza um possível alívio nas tensões bilaterais.
Contexto Histórico
Desde que o Talibã reassumiu o controle do Afeganistão após a retirada das forças da OTAN, ambos os países mantêm apenas chargés d’affaires em suas embaixadas, em vez de embaixadores de carreira ou nomeados politicamente. Essas restrições refletem:
- Acusações de Islamabad de que grupos afegãos, como o Tehrik-e-Taliban Pakistan (TTP), usam o território afegão como base para ataques no Paquistão.
- Negativa de Cabul quanto a uso de solo afegão para ações transfronteiriças, considerando-as problemas internos paquistaneses.
Detalhes da Decisão
O anúncio foi feito pelo ministro das Relações Exteriores do Paquistão, Ishaq Dar, após reunião trilateral em Pequim, em meados de maio de 2025, com o ministro afegão Amir Khan Muttaqi e o principal diplomata chinês. Dar afirmou que, desde sua visita a Cabul em 19 de abril de 2025, as relações seguem uma trajetória positiva:
“Para manter esse ímpeto, estou satisfeito em anunciar a elevação do nosso chargé d’affaires ao nível de embaixador em Cabul”, declarou Dar em sua conta no X.
O governo paquistanês ainda não divulgou o nome do diplomata indicado ao cargo.
Papel da China
A China atuou como mediadora ao hospedar o encontro em Pequim, facilitando o diálogo entre Islamabad e o governo talibã. Após o encontro, Pequim confirmou que Paquistão e Afeganistão concordaram em elevar mutuamente seus níveis de representação diplomática, reforçando seu papel crescente de interlocutor regional.
Implicações Regionais
- Reconhecimento de fato: Apesar de nenhum país ter reconhecido formalmente o Talibã, a nomeação de embaixadores é vista como um passo pragmático de reconhecimento de fato, conferindo maior legitimidade à administração afegã.
- Cooperação em segurança: A mudança deve facilitar o compartilhamento de inteligência e coordenação contra grupos militantes, sobretudo o TTP.
- Integração econômica: Com a possível reabertura de rotas comerciais — incluindo o Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC) estendido ao Afeganistão —, espera-se aumento no fluxo de investimentos e no comércio bilateral.
Desafios Persistentes
- Direitos humanos: A comunidade internacional mantém exigências sobre avanços em direitos das mulheres e minorias sob o governo talibã.
- Ameaças terroristas: Grupos como o Estado Islâmico Khorasan (EI-K) ainda operam na região, representando risco à estabilidade.
- Pressões externas: Sanções e condicionantes de Estados Unidos e União Europeia permanecem, demandando reformas políticas no Afeganistão.
Análise de Especialistas
A professora Mariana Costa (IEAA-USP) destaca que “o movimento paquistanês pode ser tanto uma contraaposta ao avanço da Índia no Afeganistão quanto uma tentativa de preservar sua influência em Cabul”. Já o analista Jorge Mendonça (ORI) observa que “embaixadores conferem canais diretos de diálogo que dificilmente serão revertidos, mesmo em momentos de crise”.
Conclusão
A nomeação de um embaixador paquistanês em Cabul em 30 de maio de 2025 marca um ponto de inflexão nas relações do Sul da Ásia. Embora desafios em direitos humanos e segurança persistam, a medida abre caminho para um diálogo mais profundo, com potencial de impactos duradouros na cooperação econômica e na estabilidade regional.
Faça um comentário