
No dia 7 de junho de 2025, a Assembleia Nacional do Equador aprovou um amplo pacote de reformas legais, apoiado pelo presidente Daniel Noboa, que confere ao governo novos instrumentos para enfrentar grupos armados e desmantelar as redes de narcotráfico que financiam suas atividades criminosas. Ao consolidar poderes excepcionais em matéria de segurança, o texto busca dar continuidade à campanha contra gangues iniciada em janeiro de 2024, mas levanta também questionamentos sobre garantias judiciais e direitos humanos.
Contexto e Pano de Fundo Legislativo
Em janeiro de 2024, poucos meses após assumir interinamente a presidência, Daniel Noboa declarou um “conflito armado interno” contra as quadrilhas que vêm ampliando seu domínio em províncias-chave como Guayas e Esmeraldas. Desde então, o Executivo vem editando decretos de emergência para permitir a atuação conjunta de forças militares e policiais, além de endurecer penas por crimes ligados às drogas. A aprovação das reformas em plenário — com 84 votos favoráveis, 46 contra, 10 abstenções e um voto em branco — marca o primeiro grande avanço legislativo de sua gestão plena, iniciada em maio de 2025.
Principais Disposições da Reforma
- Reforço de Poder Executivo
- Redirecionamento Ágil de Recursos: O presidente poderá realocar verbas e efetivos sem a necessidade de processos burocráticos demorados, visando respostas rápidas a surtos de violência.
- Poder de Indulto para Forças de Segurança: Noboa passa a ter autorização para perdoar policiais e militares envolvidos em operações, o que busca proteger agentes de investigações longas, mas acende o alerta para possíveis abusos.
- Ajustes Judiciais e de Detenção
- Suspensão de Prisão Preventiva para Agentes: Policiais e militares sob investigação não serão encaminhados à prisão, ficando sujeitos apenas a avaliações semestrais.
- Tribunais Especiais: A proposta inclui, em projetos correlatos, a criação de cortes especiais para julgamento de crimes de quadrilha, acelerando procedimentos, porém desafiando a independência judicial.
- Penas Mais Severas e Novos Crimes
- Furto de Combustível: Com impacto estimado em centenas de milhões de dólares, o “combustível furtado” agora pode render até 30 anos de prisão.
- Participação em Organização Criminosa: Líderes, membros ou colaboradores de quadrilhas enfrentarão penas equivalentes às do tráfico de drogas, também de até três décadas.
- Confisco de Bens
- Apreensão Imediata: Bens vinculados a grupos criminosos — desde imóveis a contas bancárias — poderão ser confiscados de forma mais célere, reduzindo brechas para recursos escaparem da justiça.
- Incentivos Econômicos
- Subsídios a Setores Afetados: Transportes, agroindústria e petróleo receberão apoio financeiro para mitigar efeitos da violência, buscando enfraquecer o poder de recrutamento das quadrilhas por via econômica.
Contexto Político e de Segurança
Após o pico de violência em 2023 — marcado por bombardeios a estabelecimentos privados, rebeliões em presídios e até ataques a emissoras de TV — o governo alegou redução de 15% nos homicídios ao longo de 2024. No entanto, o início de 2025 registrou nova alta de 58% nos assassinatos, reacendendo a pressão por ferramentas mais drásticas. A simbiose de políticas internas com acordos de cooperação internacional tem sido central: desde 2018, Washington já repassou cerca de US$ 81 milhões em ajuda ao Equador para treinamento e inteligência, e conversas avançam sobre eventual presença de assessores militares no país.
Oportunidades e Desafios
- Velocidade vs. Direitos: A rapidez na apreensão de bens e no deslocamento de tropas pode interromper fluxos de financiamento, mas ameaça garantias constitucionais e a independência do Judiciário.
- Moral das Tropas: A possibilidade de indulto tende a elevar o moral das forças de segurança, mas cuidados são necessários para não criar cultura de impunidade.
- Impacto Econômico: Os subsídios podem fortalecer economias locais fragilizadas, mas exigem mecanismos de transparência rigorosos para evitar desvios.
Perspectivas Futuras
O êxito das reformas dependerá da capacidade institucional de implementá-las com equilíbrio: tribunais devem operar com celeridade e manter padrões de justiça; as forças de segurança, disciplina; e os programas econômicos, supervisão. Nos próximos meses, indicadores de criminalidade e relatórios independentes de direitos humanos serão cruciais para avaliar se o país consegue estabilizar a segurança sem sacrificar liberdades fundamentais.
Conclusão
As reformas aprovadas pela Assembleia Nacional do Equador representam um marco importante na estratégia de enfrentamento ao crime organizado no país. Ao ampliar os poderes do Executivo e flexibilizar alguns mecanismos judiciais, o governo de Daniel Noboa busca responder de forma rápida e eficaz às crescentes ameaças das quadrilhas que comprometem a segurança e a estabilidade econômica.
Entretanto, a efetividade dessas medidas dependerá do equilíbrio entre o rigor necessário para conter o crime e a preservação dos direitos fundamentais e do Estado de Direito. A adoção de políticas de segurança mais duras, inspiradas em modelos penitenciários e operacionais de países da região, como El Salvador, traz à tona o desafio de garantir que ações emergenciais não se transformem em violações sistemáticas das garantias democráticas.
Com a comunidade internacional atenta às experiências regionais, o Equador assume o papel de um laboratório estratégico na luta contra o crime transnacional, cujos resultados poderão influenciar políticas públicas em toda a América Latina, tanto pelos seus êxitos quanto pelas suas limitações.
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