Ruptura institucional: Shin Bet e o embate jurídico contra Netanyahu

Diretor do Shin Bet, Ronen Bar, participa de cerimônia em homenagem às vítimas do ataque do Hamas em 7 de outubro, no cemitério militar de Monte Herzl, Jerusalém.
Ronen Bar, diretor da Agência de Segurança de Israel (Shin Bet), durante cerimônia em memória das vítimas do ataque do Hamas de 7 de outubro, no cemitério militar de Monte Herzl, em Jerusalém — 27 de outubro de 2024. (Foto: Gil Cohen-Magen/Pool via Reuters)

Em um movimento sem precedentes, o chefe do serviço de inteligência interna de Israel, Ronen Bar, apresentou ao Supremo Tribunal uma declaração em que acusa o primeiro‑ministro Benjamin Netanyahu de tentar demiti‑lo por motivações pessoais e políticas, e não por questões estritamente profissionais.

Contexto da crise

Desde o ataque de 7 de outubro de 2023, que resultou em mais de mil mortes, Netanyahu vinha questionando o desempenho do Shin Bet na segurança nacional. Embora Bar tenha reconhecido publicamente as falhas de inteligência que permitiram o ataque, o primeiro‑ministro alegou ter perdido a confiança no diretor e moveu-se para sua remoção antes do fim de seu mandato.

Breve histórico do Shin Bet

O Shin Bet, também conhecido como Serviço de Segurança Interna de Israel, foi fundado em 1949. Responsável por contraespionagem, antiterrorismo e proteção de figuras-chave do Estado, a agência consolidou-se como pilar da segurança nacional, agindo com alto grau de autonomia técnica e confidencialidade. Ao longo das décadas, enfrentou desafios como infiltrações inimigas, ameaças terroristas e conflitos internos, mantendo sempre uma postura discreta e eficiente.

Acusações centrais de Ronen Bar

Na declaração de 31 páginas, Bar detalha que a tentativa de demiti‑lo começou quando se recusou a:

  • Espionar manifestantes contrários às reformas de governo e identificar financiadores de protestos.
  • Obstruir o andamento do processo de corrupção que envolve Netanyahu, negando‑se a assinar documentos que postergassem depoimentos do premiê.
  • Silenciar alertas sobre possíveis ligações entre assessores de Netanyahu e o Catar, e sobre vazamentos de documentos confidenciais à mídia.

Bar argumenta que tais pedidos violavam a independência do órgão e não tinham respaldo legal, configurando interferência política.

Reação do governo e impacto político

O gabinete de Netanyahu declarou que o afidávit de Bar era “repleto de mentiras” e que a demissão se justificava pela “falta de confiança” após o fracasso em evitar o ataque de outubro. O partido Likud acusou o diretor de transformar o Shin Bet em “uma milícia privada do Estado Profundo”, mobilizando protestos e questionando a legitimidade das instituições.

Implicações para a democracia israelense

Especialistas em direito constitucional apontam que o caso representa uma crise institucional inédita, levantando questões como:

  • Separação de poderes: a pressão por lealdade pessoal pode comprometer a imparcialidade do Estado de Direito.
  • Autonomia dos órgãos de segurança: vincular decisões de inteligência a interesses políticos fragiliza a missão técnica da agência.
  • Participação cívica: as manifestações em defesa de Bar refletem um despertar popular para a importância de instituições independentes.

Declarações de especialistas

“A tentativa de demitir Ronen Bar configura um ataque direto à soberania das instituições de Estado e à credibilidade do sistema jurídico israelense”, afirma a pesquisadora em estudos de segurança Sarah Levy, da Universidade Hebraica de Jerusalém.

“Nunca antes assistimos a um choque tão grave entre o Executivo e os serviços de inteligência internos. Estamos diante de um teste de estresse para a democracia israelense”, analisa o ex‑diretor do Conselho de Segurança Nacional, Amos Gilad.

Conclusão: um teste ao equilíbrio institucional

O embate entre Ronen Bar e Benjamin Netanyahu transcende uma simples disputa por cargos, expondo tensões profundas sobre o papel das agências de inteligência, a integridade do processo judicial e a salvaguarda dos pilares democráticos em Israel. A decisão do Supremo Tribunal, aguardada para as próximas semanas, definirá se o país preserva sua independência institucional ou se cede a pressões políticas que podem alterar para sempre o equilíbrio de poder.

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