Rússia exige cedência de território e impõe novas condições em negociações na Turquia

Ministro das Relações Exteriores da Turquia, Hakan Fidan, preside reunião entre negociadores da Ucrânia e da Rússia em Istambul, em 16 de maio de 2025.
O chanceler turco Hakan Fidan conduz encontro entre delegações ucraniana e russa em Istambul, marcando a primeira negociação direta em três anos — 16 de maio de 2025. (Foto: Arda Kucukkaya/Ministério das Relações Exteriores da Turquia/Reuters)

Nas primeiras conversas diretas entre Rússia e Ucrânia em mais de três anos, realizadas em Istambul em 16 de maio de 2025, a delegação russa apresentou demandas que extrapolam amplamente o esboço de paz proposto pelos Estados Unidos no mês anterior. Segundo um alto funcionário ucraniano que falou sob anonimato à Reuters, as condições russas configuram, na prática, uma capitulação territorial e reforçam o ceticismo sobre a real disposição de Moscou em negociar um cessar‑fogo duradouro.

Contexto das propostas americanas

O rascunho de paz preparado pelos EUA em abril de 2025 previa:

  • Cessar‑fogo prévio, permitindo negociações subsequentes;
  • Reconhecimento de jure da Crimeia como parte da Rússia;
  • Reconhecimento de facto dos territórios russamente controlados em Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia;
  • Compensação financeira à Ucrânia pelos danos de guerra.

Esse texto buscava equilibrar o respeito à soberania ucraniana com as realidades de fato no terreno.

Demandas apresentadas por Moscou

De acordo com a fonte ucraniana, os negociadores russos transmitiram verbalmente quatro exigências principais, sem documento oficial:

  1. Retirada total das tropas ucranianas de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia antes de qualquer cessar‑fogo;
  2. Reconhecimento internacional de cinco partes do território ucraniano — Crimeia, Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia — como pertencentes à Federação Russa;
  3. Transformação da Ucrânia em estado neutro, sem armas de destruição em massa e sem presença militar de aliados ocidentais;
  4. Renúncia mútua a indenizações por danos de guerra, eliminando qualquer obrigação de reparação.

Reação ucraniana e alinhamento ocidental

Kiev qualificou as propostas russas como “non‑starters” (pontos mortos) e inaceitáveis, por equivalerem a uma rendição pura e simples. Autoridades ucranianas afirmaram que tais condições visam perpetuar o domínio de Moscou sobre vastas áreas, além de minar a soberania nacional.

Paralelamente, líderes europeus e os EUA intensificaram as sanções contra a Rússia, pressionando por um endurecimento adicional caso Moscou mantenha-se inflexível. O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky reafirmou seu apelo por um encontro direto com Vladimir Putin como “próximo passo” para viabilizar um acordo de paz.

Novos desenvolvimentos pós‑Istambul

  • Troca de prisioneiros: Rússia e Ucrânia concordaram em liberar 1.000 prisioneiros de guerra de cada lado — a maior troca desde o início do conflito.
  • Convite ao diálogo: o chanceler turco Hakan Fidan e o Vaticano se colocaram à disposição como mediadores para futuras rodadas de conversações.
  • Ataque russo após as negociações: poucas horas depois dos contatos em Istambul, um ataque de drone russo matou nove civis no leste da Ucrânia, levando Zelensky e líderes europeus a exigirem sanções adicionais contra Moscou.

Implicações geopolíticas

  • Coesão Ocidental: a recusa russa às propostas moderadas reforça a unidade da OTAN e de parceiros europeus em torno da Ucrânia.
  • Crise humanitária: sem cessar‑fogo imediato, as populações civis continuam sob risco, com recursos escassos e infraestrutura destruída.
  • Precedente internacional: aceitar mudanças de fronteiras por força militar abriria um perigoso precedente para o direito internacional e a segurança coletiva.
  • Futuro da neutralidade ucraniana: a exigência de neutralidade completa fragiliza garantias de defesa oferecidas pelos aliados ocidentais.

Perspectivas e desafios

Embora o Kremlin tenha declarado “satisfação” com o progresso em Istambul e manifestado “vontade de manter o diálogo”, a disparidade entre as propostas sinaliza que os próximos passos exigirão:

  • Cessar‑fogo prévio, conforme defendem Kiev e seus aliados;
  • Observação internacional do cumprimento das cláusulas acordadas;
  • Envolvimento de organismos multilaterais, como ONU e OSCE, para legitimar o processo.

A principal questão permanece: como equilibrar a soberania ucraniana com as exigências russas sem desestabilizar o arcabouço legal internacional? Sem compromissos concretos de ambas as partes, o risco de prolongamento do conflito e agravamento da crise humanitária segue elevado.

Conclusão


As negociações em Istambul evidenciaram a profunda assimetria entre as metas de paz defendidas pelo Ocidente e as condições draconianas apresentadas por Moscou. Com a troca de prisioneiros e a promessa de novos encontros, há abertura para continuidade do diálogo. Porém, sem concessões reais e a mediação de garantes internacionais, a guerra de desgaste dificilmente dará lugar a um acordo estável. A comunidade global aguarda se as próximas rodadas conseguirão transformar o impasse em soluções duradouras ou se o conflito se agravará ainda mais.

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