Sudão em Crise: al-Burhan Nomeia Ex-Oficial da ONU como Primeiro-Ministro em Meio à Guerra Civil Prolongada

General Abdel Fattah al-Burhan levantando o punho após desembarcar de helicóptero em Cartum, Sudão, em 26 de março de 2025.
O chefe do exército sudanês, Abdel Fattah al-Burhan, levanta o punho em gesto de vitória ao desembarcar de um helicóptero em Cartum no dia 26 de março de 2025, data em que declarou o controle do exército sobre a capital. [Handout/Sudan Sovereign Council via Reuters]/ Al Jazeera

O líder do exército sudanês e chefe de fato do Estado, general Abdel Fattah al-Burhan, nomeou o ex-oficial das Nações Unidas Kamil Idris como primeiro-ministro, em uma tentativa de reorganizar o Conselho Soberano do país. A decisão ocorre em meio ao agravamento da guerra civil que já dura três anos, deixando um rastro devastador de mortes, destruição e deslocamento.

Contexto do Conflito e Consequências Humanitárias

O Sudão enfrenta um dos mais graves conflitos internos da África nos últimos anos. A guerra, que se intensificou em abril de 2023, tem como protagonistas o exército nacional, liderado por al-Burhan, e as Forças de Apoio Rápido (RSF), um grupo paramilitar comandado por Mohamed Hamdan Dagalo, conhecido como Hemeti.

Originalmente, as RSF foram criadas para combater insurgências na região de Darfur, mas a disputa pelo controle e a falha em integrar as forças levou ao confronto aberto entre os dois líderes. Desde então, o conflito já matou dezenas de milhares de pessoas, destruiu infraestrutura crítica e forçou mais de 12 milhões a abandonar suas casas — um terço da população do país.

De acordo com o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), mais de 25 milhões de pessoas precisam de assistência, e a situação é classificada como uma das maiores crises humanitárias globais em 2025.

Nomeação de Kamil Idris e Reorganização do Conselho Soberano

Em um decreto constitucional, al-Burhan nomeou Kamil El-Tayeb Idris Abdelhafiz, ex-diretor-geral da Organização Mundial de Propriedade Intelectual da ONU, como primeiro-ministro. Diplomata de carreira, Idris tem ampla experiência internacional, incluindo passagens pelo Ministério das Relações Exteriores do Sudão e pela missão permanente do país na ONU. Em 2010, concorreu como candidato independente à presidência do Sudão.

Idris substitui Dafallah al-Haj Ali, que ocupava interinamente o cargo há menos de um mês. Além da nomeação do novo primeiro-ministro, al-Burhan acrescentou duas mulheres ao Conselho Soberano: Salma Abdel Jabbar Almubarak e Nowara Abo Mohamed Mohamed Tahir — um gesto que pode indicar tentativas de ampliar a representatividade do órgão.

Divisão de Poder e Governo Paralelo

Enquanto al-Burhan tenta consolidar um governo liderado pelo exército, Dagalo anunciou um governo rival em abril de 2025, após assinar uma carta de entendimento com aliados em Nairóbi, Quênia. Essa cisão institucional intensifica a fragmentação do país, com o exército controlando o centro, norte e leste, incluindo a capital Cartum, e as RSF dominando grande parte de Darfur e regiões ao sul.

Nos últimos meses, o exército conseguiu algumas vitórias militares, incluindo a tomada de Cartum, mas as RSF têm atacado repetidamente Port Sudan, afetando infraestruturas vitais.

Impactos Regionais e Reações Internacionais

A prolongada instabilidade sudanesa tem repercussões para toda a região do Chifre da África. Países vizinhos como Chade, Egito e Sudão do Sul enfrentam pressões crescentes devido ao aumento no fluxo de refugiados, que agravam crises humanitárias locais e instabilidade política.

O Egito, importante ator regional, tem buscado uma mediação discreta entre as facções sudanesas, preocupado com a segurança de suas fronteiras e a estabilidade do Nilo, vital para seu abastecimento hídrico.

Organizações internacionais, incluindo a ONU e a Human Rights Watch, alertam para a escalada da violência contra civis, destruição de hospitais, escolas e centros de ajuda humanitária, além de denúncias de violações dos direitos humanos por ambos os lados do conflito.

Cenários Fututos e Desafios para a Paz

A nomeação de Kamil Idris pode ser vista como um movimento estratégico de al-Burhan para fortalecer sua posição política e tentar trazer alguma estabilidade institucional, mas a existência de um governo paralelo das RSF evidencia a fragilidade do processo.

Especialistas apontam que, enquanto não houver um acordo de paz realista e inclusivo que contemple a integração das forças e a realização de eleições democráticas, o Sudão corre o risco de se tornar um Estado falido, com o território dividido entre facções rivais e a população sofrendo uma crise humanitária prolongada.

A comunidade internacional segue monitorando a situação com preocupação, destacando a necessidade urgente de cessar-fogo, acesso humanitário e diálogos políticos para evitar uma escalada ainda maior.

Conclusão

O Sudão permanece mergulhado em uma guerra civil que já provocou uma das maiores crises humanitárias do mundo. A nomeação de Kamil Idris como primeiro-ministro pelo líder militar Abdel Fattah al-Burhan representa uma tentativa de reestruturação do poder, mas a rivalidade com Mohamed Hamdan Dagalo e a formação de governos paralelos evidenciam o impasse político.

Sem um acordo político abrangente, a população sudanesa segue pagando o preço mais alto, enquanto a região do Chifre da África enfrenta riscos de instabilidade crescente. O desafio imediato para a comunidade internacional é mediar um cessar-fogo duradouro e garantir que a ajuda chegue a quem mais precisa.

Informação Recente

Segundo relatório divulgado em maio de 2025 pelo Conselho de Segurança da ONU, houve um pedido unânime para a imposição de um cessar-fogo imediato e para que as partes permitam a entrega de ajuda humanitária sem impedimentos. No entanto, até o momento, os combates continuam intensos, e a diplomacia ainda não produziu avanços significativos.

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