
Em um movimento de forte impacto diplomático e jurídico, o governo da Turquia anunciou oficialmente sua adesão às medidas propostas pelo chamado “Hague Group”, uma coligação informal de países e organizações internacionais que vêm pressionando Israel a responder judicialmente por alegadas violações do direito internacional durante o conflito com os palestinos, especialmente na Faixa de Gaza. A decisão, relatada pela Reuters em 28 de julho de 2025, marca uma mudança significativa na postura da política externa turca, que tradicionalmente buscava mediar conflitos no Oriente Médio, mas que agora opta por um caminho mais confrontativo.
O que é o “Hague Group”?
O “Hague Group”* é uma iniciativa formada após os relatos de crimes de guerra e crimes contra a humanidade durante a ofensiva israelense em Gaza, iniciada em outubro de 2023. Embora não formalizado por tratados, conta com a participação de países europeus, latino-americanos e africanos, além de organizações de direitos humanos e especialistas em direito internacional.
Seus principais objetivos incluem:
- Apoiar investigações do Tribunal Penal Internacional (TPI) sobre possíveis crimes cometidos por forças israelenses em territórios palestinos;
- Implementar sanções unilaterais e multilaterais contra indivíduos israelenses considerados responsáveis;
- Restringir exportações de armas e equipamentos militares a Israel, com base no Arms Trade Treaty e convenções de Haia;
- Criar fundamentos jurídicos para emissão de mandados de prisão internacionais contra altos oficiais israelenses.
“Hague Group” é uma designação informal utilizada por analistas políticos e parte da imprensa internacional para se referir à articulação de países e entidades que apoiam ações legais internacionais contra Israel. O grupo não possui nome oficial nem status jurídico formal.
A entrada da Turquia: implicações políticas e jurídicas
O governo de Recep Tayyip Erdoğan anunciou, em Ancara, que seguirá plenamente as diretrizes do Hague Group, comprometendo-se a:
- Apoiar ativamente as investigações do TPI, fornecendo informações de inteligência e financiamento para processos contra oficiais israelenses.
- Imposição de restrições legais à exportação e importação de armamentos entre empresas turcas e israelenses, alinhando-se aos critérios do Arms Trade Treaty, ao qual a Turquia aderiu em 2004.
- Emissão de mandados administrativamente simbólicos que poderão impedir a entrada de autoridades israelenses em território turco.
- Coordenação com nações muçulmanas e membros não permanentes do Conselho de Segurança da ONU para propor resoluções de censura ou sanção a Israel.
O ministro das Relações Exteriores, Hakan Fidan, declarou: “A comunidade internacional não pode mais assistir passivamente às violações cometidas com impunidade. A Turquia fará sua parte para garantir justiça às vítimas palestinas.”
Relação com o Tribunal Penal Internacional
Embora a Turquia tenha assinado o Estatuto de Roma em 2000, ela não chegou a ratificar o tratado e, portanto, não é parte plena do TPI. Já a Palestina, tendo ratificado o Estatuto em janeiro de 2015, conferiu jurisdição ao tribunal sobre crimes cometidos em seu território. Com a adesão ao Hague Group, a Turquia oferece suporte político e logístico ao TPI e às ONGs que atuam em Gaza, aumentando a pressão para que o tribunal acelere investigações e busque mandados contra suspeitos.
Segundo especialistas, o respaldo de um Estado com significativo peso geopolítico fortalece legitimidade e cria barreiras diplomáticas a tentativas de obstrução: “O apoio turco eleva o custo político para qualquer nação que tente bloquear processos do TPI”, avalia Dr. Ziya Aydın, professor de Direito Internacional na Universidade de Istambul.
Impactos nas relações bilaterais Turquia–Israel
A medida representa um novo congelamento nas frágeis relações diplomáticas com Israel. Nos meses anteriores, Ancara e Jerusalém vinham explorando parcerias em energia e comércio, mas o anúncio do Hague Group levou Jerusalém a chamar de volta seu embaixador em Ancara e a avaliar sanções econômicas contra empresas turcas.
Em resposta oficial, o Ministério das Relações Exteriores de Israel classificou a ação turca como “um apoio implícito ao terrorismo” e alertou para “consequências sérias em cooperação de segurança regional”.
Além disso, analistas apontam que setores como o comércio de gás natural, o turismo bilateral e a colaboração em tecnologias agrícolas e de segurança cibernética podem ser negativamente impactados. Estima-se que mais de 5 bilhões de dólares em acordos comerciais estejam em risco com o esfriamento das relações diplomáticas.
Reações internacionais recentes
- Catar e Argélia indicaram estudo para adesão futura às medidas do Hague Group.
- Estados Unidos manifestaram preocupação com ações que possam dificultar negociações de cessar-fogo e estabeleceram como prioridade “equilíbrio diplomático”.
- União Europeia, embora crítica às violações em Gaza, chamou turcos e israelenses ao diálogo multilaterai, evitando isolamentos mútuos.
- Human Rights Watch saudou a iniciativa como um passo importante para responsabilização internacional.
Importante destacar que, segundo relatório publicado pela ONU em julho de 2025, mais de 60 mil pessoas já morreram na Faixa de Gaza desde o início da ofensiva israelense em outubro de 2023, sendo uma parcela significativa composta por civis, incluindo milhares de crianças.
Análise: redefinição de eixos
A decisão da Turquia vai além do jurídico, representando um reposicionamento geopolítico claro: defender causas do mundo muçulmano, desafiar políticas ocidentais e afirmar autonomia diplomática. No entanto, traz riscos de isolamento em fóruns ocidentais e potenciais retaliações econômicas.
Conclusão
A adesão da Turquia ao Hague Group configura um marco na judicialização do conflito israelo-palestino, pressionando Israel por meio de ferramentas legais internacionais. À medida que a crise humanitária em Gaza se agrava, esse instrumento surge como um dos mais relevantes mecanismos de pressão global — e a Turquia assume papel de protagonista nesse cenário.
Faça um comentário