Cúpula UE–Moldávia em Chișinău: avanços, impasses e perspectivas para a integração europeia

Bandeiras da União Europeia e da Moldávia lado a lado, simbolizando cooperação e integração entre os dois.
Bandeiras da União Europeia e Moldávia na Cúpula UE–Moldávia em Chișinău, reforçando o compromisso com a integração europeia.

Em Chișinău, a presidente moldava Maia Sandu recebeu a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, para uma cúpula que consolidou o apoio político da União Europeia ao pedido de adesão da Moldávia. Apesar do impasse causado pelo veto da Hungria ao avanço paralelo da candidatura da Ucrânia — medida que Budapeste justifica por questões bilaterais em torno da minoria húngara na Transcarpácia —, líderes europeus reiteraram que não existem “razões objetivas” para barrar o início da fase 1 das negociações para ambos os países e amadurecem a ideia de desvincular os processos.

No mesmo encontro, Bruxelas confirmou o desembolso de até € 1,9 bilhão no âmbito do Reform and Growth Facility for Moldova, incluindo € 520 milhões em subvenções e € 1,5 bilhão em empréstimos concessionais, com pré‑financiamento acelerado de 18% para impulsionar reformas estruturais e a resiliência nacional. Paralelamente, o Parlamento Europeu adotou uma resolução que enaltece o fechamento dos processos de triagem dos clusters 1 e 2 (fundamentos e mercado interno), apelando ao Conselho para um encaminhamento meritocrático das próximas etapas das negociações.

Contexto histórico e institucional

Pedido de adesão e status de candidato
A Moldávia solicitou oficialmente sua adesão à UE em março de 2022, obtendo o estatuto de “país candidato” em junho de 2022. As negociações de adesão foram formalmente abertas em junho de 2024, num pacote paralelo ao da Ucrânia, motivadas em grande parte pela invasão russa na Ucrânia e preocupações com a segurança no Leste Europeu.

Agenda de reformas
A UE exige para o avanço na “Fase 1” (Cluster 1 – Fundamentos) a implementação de um conjunto de reformas estruturais: fortalecimento do Estado de direito, combate à corrupção e ao crime organizado, respeito aos direitos fundamentais e independência judicial. Bruxelas destaca que a Moldávia tem cumprido de forma consistente seu plano de reformas, apesar de desafios internos e das tentativas de desestabilização russa.

O condicionamento pela Ucrânia e o veto húngaro

Veto de Budapeste
O primeiro obstáculo concreto ao avanço simultâneo de Moldávia e Ucrânia é o princípio da unanimidade: basta um Estado‑membro discordar para bloquear o processo. A Hungria, sob o governo de Viktor Orbán, utiliza esse poder de veto para condicionar o progresso ucraniano a questões bilaterais, sobretudo relativas a direitos da minoria húngara na região de Transcarpácia.

Debate sobre “decoupling”
Diante do impasse, diplomatas europeus avaliam a possibilidade de “desvincular” formalmente o dossiê moldavo do ucraniano, permitindo que Chişinău avance mesmo enquanto Kyiv permanece bloqueada. A proposta, contudo, gera controvérsias: por um lado, reforçaria a credibilidade do processo de ampliação ao premiar critérios cumpridos; por outro, poderia deixar a Ucrânia “para trás”, minando a confiança de Kiev na palavra europeia.

Apoio financeiro: Plano de Crescimento da Moldávia

  • Magnitude do pacote
    Durante a cúpula, a Comissão reiterou o Moldova Growth Plan, o maior programa de assistência desde a independência moldava, orçado em até € 1,9 bilhão para o triênio 2025–2027.
  • Composição dos fundos
    Segundo o Parlamento Europeu, o pacote inclui € 520 milhões em subvenções não reembolsáveis e até € 1,5 bilhão em empréstimos, com taxa de pré-financiamento de 18 %.
  • Objetivos e contrapartidas
    Os recursos visam sustentar reformas na administração pública, sistema judiciário e setor energético, além de promover a convergência com o mercado único europeu. A liberação dos tranches está condicionada à implementação de metas concretas no quadro do Reform and Growth Facility for Moldova.

Benefícios práticos: roaming e comércio

Acordo de Associação e Zona de Comércio Livre Abrangente
Em vigor desde 1 de julho de 2016, o acordo elimina a maior parte dos direitos de importação entre a UE e a Moldávia e amplia o acesso recíproco ao mercado de serviços, servindo de alicerce para o desenvolvimento económico e atração de investimentos.

Roaming
A UE comprometeu-se a estender a eliminação de tarifas de roaming para assinantes moldavos, garantindo comunicações transfronteiriças sem custos adicionais. Essa medida busca aprofundar a integração social e econômica, facilitando intercâmbios entre cidadãos, empresas e instituições.

Dinâmicas políticas internas e conjuntura eleitoral

Eleições parlamentares de setembro de 2025
A visita de von der Leyen e Costa precede as eleições legislativas marcadas para 28 de setembro. A coligação pró-europeia liderada pela presidente Sandu e pelo primeiro‑ministro Dorin Recean busca reforçar sua base no Parlamento, usando o impulso pró-UE como argumento eleitoral.

Desafios domésticos
Apesar do crescimento econômico moderado e de avanços institucionais, a Moldávia ainda enfrenta problemas estruturais: dependência energética da Rússia, fragilidade do Estado de direito e impacto da desinformação russa ― sobretudo em Gagauzia e enclaves transnistrianos.

Implicações geopolíticas

Equilíbrio leste–oeste
A adesão da Moldávia reduziria a influência russa no flanco oriental da UE, reforçando a coesão estratégica e a segurança energética — especialmente importante após as lições da guerra na Ucrânia. Líderes como Charles Michel defendem que a ampliação até 2030 é “imperativo geopolítico” para evitar um novo “Muro de Ferro” na Europa.

Credibilidade do processo de expansão
A demora no desbloqueio do processo mina a percepção de que a UE cumpre suas promessas, podendo desincentivar reformas nos países candidatos. A independência dos critérios meritocráticos é vista como pilar fundamental para manter a adesão como “prêmio” pelas transformações internas.

Perspectivas e próximos passos

  1. Decisão sobre “decoupling”: até o fim do semestre, membros discutirão se avançam formalmente com apenas a Moldávia.
  2. Liberação dos primeiros tranches do Growth Plan, após verificação de metas de reformas.
  3. Implementação técnica do roaming, incluindo ajustes regulatórios e coordenação entre operadores.
  4. Reforço da Resiliência Democrática: intensificação da cooperação da UE no combate à desinformação, por meio de apoio a mídia independente e missões de monitoramento eleitoral.
  5. Negociações multilaterais: eventual tramitação no Parlamento Europeu de relatórios sobre a continuidade do processo de adesão, condicionada ao cumprimento de benchmarks.

A cúpula de Chișinău não só reafirmou o apoio político da UE à Moldávia, mas também traduziu-se em compromissos concretos — financeiros, regulatórios e técnicos — que podem acelerar a convergência com os padrões europeus. Contudo, o êxito dependerá da capacidade de moldavos e europeus de superar o impasse ucraniano e de manter uma via de reformas sustentáveis no país. O desfecho influenciará não apenas as perspectivas da Moldávia, mas a credibilidade e a coesão estratégica da própria União Europeia.

Conclusão

A cúpula em Chișinău reforçou o compromisso político e financeiro da União Europeia com a Moldávia, traduzido num ambicioso pacote de até € 1,9 bilhão para promover reformas e aproximar o país aos padrões europeus. Ao mesmo tempo, ficou evidente que o impasse em torno da candidatura ucraniana — bloqueada pelo veto húngaro — continua a influenciar o ritmo de avanço do processo de adesão. O debate sobre o “desvincular” as duas candidaturas reflete a tensão entre manter a coerência da política de ampliação e responder às conquistas concretas dos Estados candidatos.

Para a Moldávia, o desafio imediato é cumprir rigorosamente as metas acordadas no Reform and Growth Facility: aprofundar o Estado de direito, garantir independência judicial e combater a corrupção, tudo isso num ambiente político interno marcado por eleições e por tensões regionais. Já a UE precisa demonstrar que seu processo de adesão é verdadeiramente meritocrático, capaz de premiar o esforço reformista sem ficar refém de vetos unilaterais.

Em última análise, o sucesso desse capítulo dependerá da capacidade de Bruxelas e Chișinău de manter um diálogo constante e pragmático — onde as datas e os trâmites burocráticos sejam menos determinantes que os resultados efetivos para os cidadãos moldavos. Se as expectativas forem atendidas, a Moldávia poderá servir de exemplo para futuros processos de ampliação e fortalecerá a coesão e relevância geopolítica da União Europeia no seu flanco oriental.












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