Desafio da Etiópia: Acordo Preliminar com o FMI e o Futuro da Reestruturação da Dívida

Vista do skyline de Addis Ababa, Etiópia, em 3 de novembro de 2021.
Vista geral do skyline de Addis Ababa, capital da Etiópia, capturada em 3 de novembro de 2021.REUTERS/Tiksa Negeri/File Photo

A Etiópia está prestes a fechar, nos próximos dias, um acordo preliminar com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para a terceira revisão de seu programa de empréstimo de US$ 3,4 bilhões, que será submetido ao conselho executivo em junho de 2025, segundo o ministro das Finanças, Eyob Tekalign. Paralelamente, o país se prepara para iniciar, no verão, negociações formais com os detentores de seu Eurobond de US$ 1 bilhão, buscando equilibrar extensão de prazos e eventuais cortes no principal (“haircuts”) para restabelecer a sustentabilidade da dívida.

Contexto do Programa com o FMI

  • Origem: Em julho de 2024, a Etiópia assinou um programa de quatro anos com o FMI, no valor de US$ 3,4 bilhões, para apoiar reformas macroeconômicas estruturais, incluindo a flutuação da moeda local (birr) e acumulação de reservas.
  • Desempenho: Até agora, o país superou várias metas, notadamente em acumulação de reservas, controle da inflação e crescimento das exportações, “surpresas agradáveis” segundo o ministro Eyob.
  • Próximos passos: A aprovação da terceira revisão em junho será necessária para liberar a próxima parcela do empréstimo.

Dados Quantitativos

Indicadores Macroeconômicos Recentes

IndicadorValor 2023Variação em relação a 2022
Crescimento do PIB (anual)6,50 %+1,18 p.p.
Inflação (CPI, anual)30,22 %–3,67 p.p.
Exportações (US$)10,79 B+3,27 %

Evolução da Dívida Externa

A tabela abaixo compara a dívida externa (em US$ bilhões) da Etiópia com Quênia e Tanzânia, de 2018 a 2022, para dimensionar o desafio regional:

AnoEtiópiaQuêniaTanzânia
201827,8431,4322,36
201928,3834,9724,17
202030,3638,0425,55
202129,9841,2228,51
202228,6141,5630,1

Análise de Impacto Social

  • Poder de compra: A queda da inflação de 33,9 % em 2022 para 30,2 % em 2023 alivia, mas ainda pressiona o orçamento familiar; alimentos representam mais de 50 % do índice de preços.
  • Serviços públicos: Um eventual “haircut” em grandes credores poderia reduzir as despesas com dívida, mas pressiona discussões sobre cortes em saúde e educação, possivelmente agravando vulnerabilidades sociais.
  • Segurança alimentar: Mais de 20 milhões de etíopes enfrentaram insegurança alimentar severa em 2023, segundo o Banco Mundial. Ajustes fiscais bruscos podem agravar a crise humanitária.

Negociações com Credores

  • Credores oficiais: Acordo preliminar de reestruturação de US$ 8,4 bi no Common Framework do G20, focado em extensão de prazos, sem cortes nominais no principal.
  • Bondholders: Impasse entre liquidez vs. solvência. Comitê de detentores de títulos argumenta que o DSA do FMI “artificialmente” cria um problema de solvência, quando seria apenas liquidez. As negociações formais dependem agora da última rodada de DSA do FMI.

Entrevistas com Especialistas

A Etiópia está em melhor posição de reestruturar sua dívida de forma ordenada, graças ao robusto crescimento das reservas e controle inflacionário alcançado até aqui.”
— Mamo Mihretu, governador do Banco Central da Etiópia.

“A análise de sustentabilidade de dívida precisa refletir a realidade de liquidez, para evitar exigir haircuts que comprometeriam investimentos em saúde e educação.”
— Brian Pinto, ex-economista sênior do Banco Mundial.

Histórico e Lições Aprendidas

  • DSA 2018/19: Etiópia foi classificada em alto risco de estresse por dívida em 2017; reformas posteriores reduziram a relação dívida/PIB de ~54 % em 2018 para ~44 % em 2022.
  • Casos regionais: Reestruturações recentes em Zâmbia (2020) e Moçambique (2016) mostram que combinação de extensão de prazos e concessões oficiais tende a ser mais viável do que cortes profundos de principal.

Previsões e Riscos

  • FMI e Banco Mundial projetam recuperação do PIB em 2025/26 com crescimento de ~7–8 % e inflação caindo a 10 % no fim de 2025/26.

Riscos:

  • Rejeição das propostas pelos bondholders, atrasando desembolsos do FMI.
  • Instabilidade política interna, que pode retardar reformas estruturais e comprometer o rating soberano.
  • Pressões sociais por corte de subsídios caso haja “haircuts” mais agressivos.

Conclusão

A Etiópia encontra-se em um ponto crítico: a aprovação iminente da terceira revisão pelo FMI e o início das negociações formais com bondholders definirão não apenas o acesso a novas parcelas do programa de US$ 3,4 bi, mas também a trajectória de investimentos em infraestrutura, saúde e educação. O equilíbrio entre extensão de prazos, eventuais cortes de principal e a manutenção de reformas internas será determinante para que o país transforme o alívio de liquidez em crescimento sustentável e desenvolvimento social.

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