
Fontes diplomáticas afirmam que o governo dos Estados Unidos condiciona a assinatura de um acordo de paz com Ruanda e República Democrática do Congo (RDC) à retirada total dos contingentes ruandeses do leste congolês. O esboço do tratado, redigido por autoridades americanas e confirmado por múltiplas fontes, prevê que Ruanda desmobilize efetivos, armamentos e equipamentos antes de selar o compromisso — medida que deve provocar forte reação em Kigali, que justifica sua intervenção como autodefesa contra milícias hutu ligadas ao genocídio de 1994.
Mediação Internacional e interesses dos EUA
A administração Trump, por meio de Massad Boulos, conselheiro sênior para a África, estabeleceu um prazo ambicioso: finalizar o acordo em cerca de dois meses, para em seguida atrair bilhões de dólares de investimentos ocidentais no setor mineral da RDC — rica em tântalo, ouro, cobalto, cobre e lítio. Para reforçar esse impulso, veja também: [RD Congo busca acordo de minerais com EUA até fim de junho].
Além da exigência de retirada, o esboço inclui um “Mecanismo Conjunto de Coordenação de Segurança” com participação de observadores militares estrangeiros, voltado a monitorar tanto eventuais remanescentes das Forças Democráticas de Libertação de Ruanda (FDLR) quanto a implementação de cessar-fogo entre o governo congolês e o M23. Outro ponto polêmico é a inclusão do M23 em um diálogo nacional em “pé de igualdade” com demais grupos não estatais, o que Kinshasa vê como concessão inaceitável — já que classifica o M23 como organização terrorista.
Posicionamentos de Ruanda e da RDC
- Ruanda: Repudia a retirada prévia, alegando que a presença de suas tropas é crucial para conter a FDLR e proteger civis tutsis. Embora Kigali não tenha respondido oficialmente ao rascunho americano, enviou especialistas a Washington para debater detalhes técnicos.
- RDC: Insiste que a retirada total seja condição inegociável. Fontes no entorno do presidente Félix Tshisekedi acusam Ruanda de protelar e afirmam que, sem essa retirada, o processo de paz ficará estagnado.
Esforços paralelos de negociação
O Catar tem servido de mediador desde março de 2025, apresentando uma proposta que também prevê desocupação gradual das forças estrangeiras e cessar-fogo imediato entre Kinshasa e o M23. Angola e a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) apoiaram inicialmente com tropas de manutenção da paz, mas se retiraram em abril após impasses logísticos e políticos.
Desafios e perspectivas
- Segurança regional: Manter ou remover tropas estrangeiras sem solução para a FDLR pode perpetuar ataques a civis e novos fluxos de refugiados.
- Investimentos estratégicos: A incerteza política e de segurança afasta investidores em minerais críticos para a indústria global de tecnologia.
- Questões de legitimidade: Integrar o M23 no processo político requer garantias de responsabilização por violações de direitos humanos, sob risco de minar a confiança em instituições congolesas.
A ousadia do cronograma americano — assinatura em dois meses — pode acelerar um desfecho, mas traz o risco de gerar ressentimentos se as garantias de segurança e justiça não forem atingidas. O sucesso dependerá de um mecanismo robusto de monitoramento internacional, possivelmente amparado por mandato da ONU, para assegurar o cumprimento de cada etapa.
Conclusão
O impasse entre RDC e Ruanda evidencia a complexidade de negociar paz em uma região onde as fronteiras entre ameaças reais e interesses estratégicos são difusas. A exigência americana de retirada prévia das tropas ruandesas pode ser um divisor de águas, mas também representa um teste à credibilidade internacional e à disposição das partes em assumir compromissos duradouros. Com os olhos do mundo voltados para o potencial mineral do leste congolês, a questão que se impõe é se os interesses econômicos prevalecerão sobre as tensões históricas e militares.
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