Suspensão dos Partidos Políticos no Mali

Assimi Goita, líder militar do Mali, durante evento oficial após tomar o poder.
Assimi Goita assumiu o comando do Mali após dois golpes militares consecutivos em 2020 e 2021 [Foto: Mahamadou Hamidou/Reuters]./ Al Jazeera

O Mali atravessa mais uma fase de tensão política após o decreto de 7 de maio de 2025 que suspende as atividades de todos os partidos políticos “até novo aviso”. A medida, assinada pelo presidente de transição, General Assimi Goita, ocorre dias após as primeiras manifestações pró-democracia desde os golpes de 2020 e 2021. Este artigo oferece uma análise jornalística e aprofundada dos fatores históricos, legais, sociais e geopolíticos que moldam este episódio, além de incorporar informações recentemente divulgadas sobre o alinhamento internacional de Bamako.

Histórico das transições políticas no Mali

Desde a independência da França, em 1960, o Mali enfrentou múltiplas rupturas institucionais e tentativas de consolidação democrática:

  • 1968: Golpe liderado pelo tenente‑coronel Moussa Traoré, instaurando uma ditadura de 23 anos.
  • 1991: Queda de Traoré após levantes populares; transição democrática com eleições em 1992 e governo de Alpha Oumar Konaré.
  • 2012: Golpe do capitão Amadou Sanogo, motivado pela insatisfação no combate aos insurgentes tuaregues no norte. A fragmentação territorial resultou na Operação Serval da França em 2013 para retomar regiões ocupadas por jihadistas.
  • 2020: Militres liderados por Assimi Goita derrubam o presidente Ibrahim Boubacar Keïta, em meio a protestos contra corrupção e insegurança. A CEDEAO impõe sanções e negocia um governo de transição civil-militar.
  • 2021: Goita remove o presidente e o primeiro‑ministro civis, assumindo a presidência da junta. A União Africana e a CEDEAO suspendem o Mali de seus órgãos até a definição de cronograma eleitoral.

Esses eventos demonstram ciclos de instabilidade, frequentemente marcados por intervenções de potências como França e organizações regionais como CEDEAO e ONU, que visam restaurar a ordem constitucional e conter o extremismo no Sahel.

Motivações Oficiais e Implicações Legais

O decreto de 7 de maio de 2025, divulgado pela televisão estatal, justifica a suspensão das “associações de caráter político” por “razões de ordem pública”, após manifestação pró-democracia em Bamako. A revogação prévia da lei que regulava partidos, uma semana antes, é interpretada por analistas como passo para dissolução permanente das legendas.

Reação dos Partidos e da Sociedade Civil

  • Coalizão de mais de 30 partidos exige o fim da transição até 31 de dezembro de 2025 e retorno ao regime constitucional.
  • Protestos em Bamako reuniram centenas de ativistas, liderados por Cheick Oumar Doumbia, que afirmaram continuar a luta democrática apesar das restrições

Impactos sobre a Democracia e Direitos Humanos

  • Liberdade de associação: Suspensão cerceia organização formal, financiamento e candidaturas.
  • Espaço cívico: Risco de criminalização de opositores; ONGs alertam para retrocesso autoritário.
  • Legitimidade internacional: A CEDEAO e a União Africana podem intensificar sanções; doações humanitárias podem ser condicionadas.

Alinhamento Internacional e Novas Parcerias

Recente relatório indica que o Mali tem se distanciado de antigos aliados ocidentais e buscado cooperação com a Rússia em segurança e mineração. Em março de 2025, Bamako anunciou sua retirada da Organização Internacional da Francofonia, citando defesa da soberania diante de sanções seletivas. Esses movimentos refletem nova estratégia geopolítica da junta para diversificar apoios externos.

Perspectivas e Cenários Futuros

  1. Radicalização da oposição: Sem canais institucionais, protestos podem intensificar‑se, elevando risco de confrontos nas ruas.
  2. Negociações controladas: Propostas de cronograma eleitoral sob supervisão militar podem acalmar pressões externas.
  3. Isolamento diplomático: Sanções regionais e internacionais podem aprofundar crise econômica, pressionando o regime por concessões.

Conclusão

A suspensão indefinida das atividades partidárias no Mali evidencia a continuidade do ciclo de instabilidade política iniciado em 2012. Ao restringir formalmente a oposição, o regime de Assimi Goita visa consolidar poder, mas arrisca intensificar mobilizações populares e atrair sanções que afetem a já frágil economia. O desfecho dependerá da resiliência dos partidos, da coesão da sociedade civil e da disposição de atores externos em condicionar qualquer apoio à restauração democrática.

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