
Pequim intensifica sua retórica contra o protecionismo de Washington e busca apoio internacional para conter medidas unilaterais de Donald Trump
Em mais um capítulo da crescente guerra comercial entre China e Estados Unidos, o primeiro-ministro chinês Li Qiang enviou uma carta ao recém-empossado premiê japonês Shigeru Ishiba, propondo uma resposta coordenada às tarifas impostas pelo presidente norte-americano Donald Trump. A informação foi revelada pela agência de notícias japonesa Kyodo, que citou fontes do governo japonês.
Segundo o relatório, a carta foi entregue por meio da embaixada chinesa em Tóquio e enfatizava a necessidade de que China e Japão “lutem juntos contra o protecionismo”. A iniciativa marca um movimento estratégico de Pequim para isolar Washington diplomaticamente e reforçar laços regionais no momento em que os Estados Unidos ampliam tarifas comerciais de forma unilateral.
Guerra comercial em espiral
Desde o início de seu mandato, Trump tem adotado uma política agressiva de tarifas e sanções comerciais, especialmente contra a China, sob o argumento de proteger a indústria e os empregos norte-americanos. No entanto, em abril de 2025, o governo Trump ampliou suas tarifas para dezenas de países, incluindo o Japão, afetando setores como o automotivo, eletrônico e de aço.
A resposta chinesa veio em forma de retaliações comerciais e de uma ofensiva diplomática mais intensa. Pequim alertou na segunda-feira que qualquer país que buscasse um **”acordo ampliado” com os Estados Unidos o faria “às custas da China”, em uma clara tentativa de desencorajar alianças bilaterais favoráveis a Washington.
Segundo o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, “qualquer tentativa de ignorar as regras multilaterais e promover interesses unilaterais será combatida com firmeza por Pequim em todos os fóruns internacionais”.
Japão entre dois polos
A posição do Japão é particularmente delicada. Como um dos principais aliados dos EUA na Ásia e um dos maiores parceiros comerciais da China, Tóquio tenta equilibrar os pratos sem se alinhar completamente a nenhum dos lados.
Ainda assim, o Japão também foi alvo das tarifas norte-americanas, o que levou o país a iniciar negociações diretas com Washington. A proposta chinesa, portanto, surge como um teste diplomático para Ishiba, que assumiu o cargo em meio à crescente pressão internacional e tensões regionais.
Em entrevista ao Nikkei Asia, o ex-embaixador do Japão na China, Uichiro Niwa, destacou: “O Japão deve adotar uma postura pragmática. Embora seja aliado dos EUA, não pode ignorar os custos econômicos de uma guerra tarifária prolongada.¨
O que a China quer de fato?
A iniciativa chinesa revela uma tentativa mais ampla de reposicionar o país como defensor da ordem comercial multilateral, em contraste com a abordagem unilateralista dos EUA. Ao convidar o Japão para formar uma frente unida, Pequim busca:
- Enfraquecer a legitimidade das sanções de Trump no cenário internacional;
- Fortalecer alianças regionais, especialmente no contexto da Ásia-Pacífico;
- Aumentar a pressão sobre Washington ao mobilizar potências econômicas contra suas políticas protecionistas.
Para Richard McGregor, especialista em política asiática no Lowy Institute, “Pequim entende que não vencerá os EUA sozinha. Por isso, está apostando em uma coalizão informal para conter os efeitos da ofensiva tarifária de Trump”.
Relações sino-japonesas: pragmatismo com ressalvas
Apesar do gesto diplomático chinês, as relações entre Pequim e Tóquio continuam marcadas por desconfianças históricas e disputas territoriais, como no caso das Ilhas Senkaku (Diaoyu, para os chineses). O governo japonês ainda não se pronunciou oficialmente sobre a carta de Li Qiang, o que revela o cuidado com que a proposta está sendo avaliada.
Em nota, o Ministério das Relações Exteriores do Japão afirmou apenas que “Tóquio continua comprometida com soluções multilaterais baseadas em regras”, sem mencionar diretamente a proposta chinesa.
Conclusão: um jogo de xadrez geopolítico
O apelo de Li Qiang ao Japão simboliza uma nova etapa no embate entre globalismo asiático e protecionismo americano. Em vez de confrontar os EUA apenas no campo econômico, a China agora aposta na diplomacia e na construção de alianças regionais para desafiar a hegemonia norte-americana.
Resta saber qual será a resposta do Japão, preso entre a dependência estratégica dos EUA e a interdependência comercial com a China. O tabuleiro asiático está em movimento, e cada jogada poderá redefinir o equilíbrio global nos próximos anos.
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